quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Diógenes Arruda e a "camarilha de renegados"


Diógenes Arruda (1914 – 1979) é figura histórica do Partidão. Elegeu-se deputado federal em 1946 pelo PSP de Adhemar de Barros e, assim, escapou da cassação de mandato que atingiu toda a bancada comunista. Em outubro de 1979, pouco antes de sua morte, escreveu um artigo em homenagem a Mauricio Grabois – “ O Dirigente Comunista se forja todos os dias” – com agressivas criticas ao PCB de Prestes. O artigo foi escrito/publicado exatos 10 anos antes da queda do muro. Provavelmente, seria o mesmo se publicado vinte anos depois – pra esse povo do PC do B, o tempo não passa.
“Diante do Surto revisionista Kruschoviano, durante os anos de 1956 a 1960, manteve firme a posição de defesa do marxismo-leninismo e do Partido e de luta contra as furiosas investidas de Prestes e sua camarilha de renegados, ocupando, neste combate, lugar proeminente. Considerável foi sua atividade, tanto político-ideológica como prática, no trabalho de reorganização marxista-leninista do Partido de 1961 a 1962, contribuindo de forma destacada, juntamente com o camarada Amazonas, para o esclarecimento de importantes problemas da revolução brasileira e na elaboração do Programa do Partido, aprovado na Conferência Nacional Extraordinária de fevereiro de 1962. Valiosa foi também sua contribuição na elaboração da tática revolucionária do Partido, aprovada na VI Conferência Nacional de junho de 1966, o mesmo acontecendo em relação a outros documentos básicos do Partido, como os Estatutos, Guerra Popular – Caminho da Luta Armada no Brasil, políticas e métodos de revolucionarização do Partido, 50 Anos de Lutas do PC do Brasil e seus principais ensinamentos, Problemas Ideológicos da Revolução na América Latina.”

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

O Marxismo de Roberto Campos


Em 31 de outubro de 1999, comemorando os 10 anos da “queda do muro” (já apodrecido), um dos principais ideólogos da direita brasileira – Roberto de Oliveira Campos, tb conhecido como Bob Fields – escreve um surpreendente artigo. “Perdeu-se o marxismo?” reconhece a “extraordinária originalidade do pensamento critico de Marx” e a genialidade do alemão ao formular “em plena era do vapor e do aço, a noção de que a existência determina a consciência”. Selecionei dois trechos do artigo daquele que, nos meus tempos de política estudantil, era considerado “entreguista” e alvo de uma passeata que terminou na porta do BNDES ( Campos era o Presidente), para protestar contra o “Acordo Roboré”, em 1958. Ainda era aluno do Pedro II e tenho grandes lembranças dessa passeata, mas, isso é outra história.

“Foi uma pena que, nestes últimos 80 anos, a complicada dinâmica da História, ao soterrar os regimes socialistas do bloco soviético, acabasse soterrando simultaneamente a florescência da extraordinária originalidade do pensamento crítico de Marx. Falo do pensamento crítico. No resto, Marx foi um péssimo profeta e um mau político. Predisse o empobrecimento do proletariado, e ele emburguesou-se. Predisse a explosão do capitalismo, e foi o socialismo que implodiu. Predisse o fenecimento do Estado e a floração da liberdade, e no "socialismo real" o contrário aconteceu: o Estado explodiu de elefantíase e as liberdades desapareceram,”
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“Nestes arrabaldes, pouca gente se tem dado conta de que o novo pensamento de raiz marxista está descobrindo, com evidente surpresa, uma série de temas novos sobre o desenvolvimento e a História. Sugestiva, por exemplo, é a ótica dos "sistemas mundiais", trabalhada, entre outros, por I. Wallerstein e E. Wolf, contestada por A. Gunder Frank, para quem o sistema político mundial pré-data de muito a ascensão do capitalismo na Europa e sua hegemonia no mundo. Ou seja, uma completa desarticulação da visão "mecânica" da "dialética da História", substituída por uma espécie de superdarwinismo, a luta de todas as forças e formações entre si. Quando o velho Marx, em plena era do vapor e do aço, formulou a noção de que a existência determina a consciência, chamou a atenção geral para o fato de que as grandes transformações pelas quais estava passando o mundo tinham uma base nas condições concretas, nas relações de produção e na tecnologia. Depois disso, tivemos uma formidável aceleração (eletricidade, motor a explosão, eletrônica, síntese química, biologia, eletrônica) e, agora, com a globalização digital, estamos entrando em cheio na era da informação. Tudo está mudando muito mais depressa do que nossa capacidade de acompanhar. Assim como o capitalismo do século 14 acabou com o escravo e o servo da gleba e o capitalismo americano atual criou uma sociedade democrática de classe média e de consumo de massa, o novo modo de produção da informação vai criar - o quê? Não sei. Precisamos de pensar. Mesmo errando, ou parecendo errar.”


sábado, 25 de dezembro de 2010

"Em torno de Marx"


Estou iniciando a leitura do novo livro ( Em torno de Marx) do filósofo Leandro Konder – presente de natal de meu compadre Molon – e selecionei um trecho do capítulo “Marx: o homem e a obra revisitados”, que estimula a reflexão sobre os danos causados pelo regime soviético ao pensamento original do velho Karl. O tema me remete a uma conversa, em Luanda, com deputado do MPLA quando, timidamente, coloquei a minha tese sobre os danos causados à obra de Marx pelo marxismo-leninismo e ouvi a resposta definitiva: “Aqui em Angola, todos os socialistas já descobriram isso há muito tempo”. Vamos a duas partes do texto:
“Por mais que tenham lamentado o fim da URSS, que deixou o mundo inteiro às voltas com a política agressiva e a prepotência dos norte-americanos, houve alguns marxistas rebeldes que confessadamente sentiram certo alivio com a imprevista derrocada do Estado fundado por Lênin. Ampliava-se assim o especo em que se podia fazer a desejável releitura de Marx, rediscuti-lo, reavaliá-lo.” .....................................................................
“ Uma recuperação da criatividade e do vigor físico do pensamento radical de Marx depende dessa espécie de ensaísta, de autores capazes de fazer comentários instigantes, provocadores. Podemos imaginar as surpresas, os sustos e as alegrias que nos seriam proporcionados por novos Gramcis, Luckacses. Adornos, Benjamins. E – por que não – por novos Antonios Cândidos, Chicos de Oliveiras, Robertos Schwarzes, Sartres, Karel Kosikes, Paulos Arantes, Michael Lôwys, Carlos Nelsons Coutinhos e outros.”

Eu agregaria à lista os Denis Collins, Moishes Postones e os Costanzos Preves.



domingo, 19 de dezembro de 2010

"Marxismos"


Penso que, decorridos um século e meio da publicação dos principais textos de Marx e Engels, ainda surgem leituras diversificadas e, por vezes, contraditórias do significado do conjunto da obra. Obra inacabada, o marxismo permite leituras e releituras ao sabor das tendências ideológicas de cada intérprete. Nem o final melancólico de 1989/91 impediu delírios do tipo Cuba, Coréia do Norte e, aqui na Terra, o PC do B. Como afirmam os autores de “História das Ideias Políticas” , as tentativas de interpretação “ só podem ser julgadas em função do projeto próprio que as anima, em sua época e em suas circunstâncias políticas”. Selecionei um trecho do livro de Fançois Châtelet, Olivier Duhamel e Evelyne Pisier-Kouchner (tradução de Carlos Nelson Coutinho, meu contemporâneo de UNE e Partidão) que comenta o “equívoco profundo” de análise do pensamento conjunto de Marx:
“O tema que Lenin recolheu de Friederich Engels, segundo o qual o pensamento de Marx possui três fontes ( a filosofia alemã, a economia política inglesa e o socialismo francês), não é falso, contanto que não se infira dele, como o faz Lênin, que esse pensamento – tendo extraído a quintessência desses três elementos – soube integrá-los num conjunto coerente. Pois o que espanta, quando lemos as milhares de páginas de textos redigidos por Karl Marx (1818-1883) e Friederich Engels(1820-1895), é ao mesmo tempo a diversidade dos temas tratados, dos níveis de intervenção e das técnicas de argumentação, por um lado, e, por outro, o equívoco profundo do projeto de conjunto; e isso porque ora se trata de elaborar nada menos do que uma nova concepção global do mundo, da sociedade e do homem, ora – mais modestamente – de contribuir, através de pesquisas Teóricas, para a luta revolucionária do movimento operário.”

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O silêncio "ensurdecedor" dos operários russos.


Denis Collin, em seu “Compreender Marx”(Editora Vozes), faz uma instigante citação de Costanzo Prevê, renomado “marxólogo”, sobre a reação da classe operária da União Soviética ao fim do comunismo:
“O silêncio ensurdecedor da classe operária na URSS e nos países da Europa do Leste, até seu consentimento na reconstrução de um capitalismo “normal”, por ocasião da grande mudança de 1989-1991, é, com diz Costanzo Preve, “um dos acontecimentos, ou melhor, dos não-acontecimentos mais importantes da história mundial destes dois últimos séculos”.

Marx em 20 minutos


Denis Collin, em seu “Compreender Marx”( Editora Vozes) defende a tese de que é fácil e rápido explicar Marx superficialmente, mas a análise profunda é tarefa árdua e um pouco mais demorada:
“ Pode-se explicar Marx em vinte minutos ou em vinte anos, dizia Raymond Aron. Em vinte minutos se percorrem as grandes teses que formaram a ossatura do marxismo histórico e, convenhamos, é um Marx possível. Sob a condição de deixar de lado a imensa massa dos escritos que vão em direções diferentes e dão testemunho de uma pesquisa em andamento, de um inacabamento sistemático. “Duvidar de tudo”: esta é a divisa de Marx e, ironia da história, foi esse o homem transformado em produtor de dogmas.”
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“Enfim, Marx pensou, simultaneamente e no mesmo movimento. O modo de produção capitalista  e o comunismo como “movimento real”. Em que medida estamos com o comunismo? Quer dizer, em que medida estamos com a esperança de uma transformação radical do mundo?”

domingo, 12 de dezembro de 2010

Lukacs e a "superação do marxismo".


György Lukács, no período pós-1945, foi uma espécie de porta voz “oficial” do marxismo. Uma tarefa encerrada em 1956, quando Lukács, Ministro da Educação do governo Imre Nagy, foi deportado para a Romênia, pelas tropas soviéticas que invadiram Budapeste. Nagy teve destino mais dramático – foi executado e enterrado secretamente, em 1958. Lukács e Nagy integravam a ala reformista do Partido Comunista Húngaro que, após a morte de Stalin, em 1953, buscavam autonomia de Moscou. Selecionei um trecho do artigo de 1920 (“Última superação do Marxismo”), em que o filósofo critica os intelectuais como “seres parasitários dentro do Estado Capitalista”:

“É difícil que se passe um ano sem que Marx seja "superado" por algum solícito livre docente ou por algum filósofo da moda. A luta mortal que a sociedade burguesa deve realizar se desenvolve também no terreno ideológico. Estas superações mostram ao observador atento sempre o mesmo rosto. Mudam o teor da demonstração, os argumentos gnosiológicos ou metafísicos parecem novos, porém o caráter essencial, o ponto de partida e o ponto de chegada, são sempre os mesmos. Eles encontram sua origem na natureza pequeno-burguesa-parasitária da situação de classe dos intelectuais. Como verdadeiros pequeno-burgueses, os intelectuais não estão em condições de ver de maneira correta a realidade da luta de classes, e portanto menos ainda estão em condições de valorá-la. Eles tendem, como disse Marx, para as instituições estabelecidas, tal como para "não abolir os dois extremos, capital e trabalho assalariado, mas sim para atenuar suas contradições e levá-los a conviver em harmonia". Dado que os intelectuais são seres parasitários dentro do Estado capitalista, este último se lhes apresenta com um absoluto, ou ainda como o Absoluto. Eles contrapõem à teoria marxista uma utopia que, despojada das frases mais ou menos sedutoras, repousa sobre a glorificação do Estado existente".


sábado, 11 de dezembro de 2010

A morte de Stalin e o artigo de Prestes


A morte de Stalin, em 5 de março de 1953, leva Prestes a produzir um lacrimoso artigo na edição de abril da Revista Mensal de Cultura Política : “Ergamos bem alto a bandeira de Stalin”.
Selecionei o Parágrafo inicial e um trecho onde o autor revela sua tradicional falta de sensibilidade política ao acusar o governo Vargas de traição e dos “esforços para entregar o petróleo brasileiro à Standard Oil”. Seis meses depois Getúlio assinava a lei 2.004 ( 3 de outubro de 1953) que criava a Petrobras e o monopólio estatal do petróleo. Isso pra não falar que 16 meses após o artigo de louvação a Stalin, Vargas se suicidaria, ameaçado por um golpe de direita

Iosif Vissarionovitch Stálin, o nosso querido camarada Stálin, não mais existe.
Neste momento, de dor imensa e profunda, meus pensamentos se dirigem para as grandes massas de nosso povo, para os trabalhadores das cidades e do campo, para todos os brasileiros que almejam uma pátria livre e progressista, dirigem-se particularmente para os jovens e as crianças de nossa terra a que sempre desejamos um futuro feliz e radioso, bem diferente da dura realidade dos dias de hoje.
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Os traidores que nos governam podem aprovar tratados militares, podem continuar fazendo esforços para entregar o petróleo brasileiro à Standard Oil, podem prometer aos banqueiros ianques o sangue de nossa juventude em troca dos empréstimos americanos, mas o povo brasileiro persistirá até o fim em sua luta pela paz, há de provar na prática que jamais empunhará armas contra os povos da União Soviética, que é capaz de libertar o Brasil do jugo imperialista e de pôr abaixo o atual governo de traição de Vargas.



sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Alvaro Cunhal. O sonho nunca se acaba.


Nos primeiros dias de  junho de 1974, eu, Thereza e um amigo desembarcamos em Portela de Sacavém e encontramos uma Lisboa que ainda comemorava o 25 de abril. Nas calçadas da Avenida de Liberdade espalhavam-se livros da Editora Vitória, certamente fugidos da perseguição da ditadura militar brasileira. E nas bancas, o jornal do Partido Comunista Português ainda estampava a foto de Álvaro Cunhal a liderança histórica do PCP em seu retorno a Portugal, depois de anos de exílio. Em 21 de maio de 1993 - doze anos antes de sua morte e quatro após a queda do muro – Cunhal profere palestra com o tema “O Comunismo hoje e amanhã”. Segue um pequeno trecho que comprova que os sonhos nunca se acabam, pelo menos para sonhadores com o líder lusitano.
“Considerando a derrocada da URSS e dos regimes do leste da Europa, a mudança daí resultante da correlação mundial de forças e a nova pretensão de restabelecimento do domínio, exploração e hegemonia mundial pelo imperialismo, espalha-se a ideia de que o projecto comunista fracassou, de que “o comunismo morreu”, de que “o comunismo não tem futuro” e de que afinal o capitalismo mostrou ser um sistema capaz de resolver os problemas da humanidade, um sistema superior e melhor que um sistema socialista.
Temos opinião diferente.
Nem o projecto comunista de uma sociedade nova e melhor, deixou de ser válido, nem o capitalismo se mostrou ou mostra capaz de resolver os grandes problemas da humanidade e se pode considerar um sistema definitivo.
O capitalismo sofreu, é certo, alterações ao longo do século XX nas suas estruturas económicas e sociais. Desenvolveram-se a internacionalização dos processos económicos e sistemas de cooperação e integração. As forças produtivas receberam poderoso impulso com a revolução científico-técnica.
Mas o capitalismo manteve e mantém as suas características essenciais, como sistema de exploração, opressão e agressão, marcado por injustiças, desigualdades e flagelos sociais. O capitalismo é um sistema em que há classes que exploram e classes que são exploradas, classes que dominam e outras que são dominadas, classes que governam em seu proveito e outras que para seu mal são governadas, classes que constituem uma minoria da população que concentra a riqueza e a usufrui em excesso e classes que constituem a maioria esmagadora da população que vive com graves carências e que, em vastíssimos sectores, vive numa zona social sombria de pobreza e miséria.
Internacionalmente, é um sistema em que os países mais desenvolvidos, mais ricos e mais fortes exploram, dominam, subjugam e oprimem pelas mais variadas formas os países mais atrasados, mais pobres e mais fracos, mantendo e criando no mundo zonas imensas de fome que afecta e mata milhões de seres humanos.”


quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Postone. Uma releitura de Marx. Parte 3


O texto “Necessidade, Tempo e Trabalho” de Moishe Postone, professor de história da Universidade de Chicago, está disponível, em português,  em http://obeco.no.sapo.pt/mpt2.htm
Entre outros temas, o autor questiona as transformações que a inovação tecnológica pode provocar na relação capital X trabalho. Vide um pequeno e provocante trecho:
O desenrolar do capitalismo impulsiona para adiante o desenvolvimento tecnológico, cuja forma concreta continua sendo a de um instrumento de dominação – mas, ainda assim, cujo crescente potencial permite uma transformação da sociedade, uma utilização reflexiva deste potencial sobre a divisão social do trabalho, tal que não apenas o objetivo da produção com máquinas, mas as próprias maquinas serão diferentes.
A possibilidade desta reversão dialética permite a superação e a rejeição das duas posições socialmente críticas antinômicas que são imanentes à formação social determinada pelo capital: (1) a tentativa de "superar" o trabalho alienado e a alienação das pessoas em relação à natureza, através da rejeição da tecnologia industrial per se, na esperança de um retorno impossível a uma sociedade pré-industrial e (2) a tentativa de lutar por um modo justo de distribuição da grande massa de bens e serviços produzidos, aceitando uma continuação linear da tecnologia determinada pelo capital em sua forma manifesta – uma forma de produção que tende a solapar "as fontes originais de toda a riqueza – o solo e o trabalhador". 44 Ambas as posições são imanentes à forma capitalista de aparência, na medida em que cada uma delas apreende apenas – quer aceitando, quer rejeitando – aquilo que é manifesto: a dimensão do valor tal como ela é expressa no aspecto material da dimensão do valor de uso.”


terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Existe um marxismo "correto"? Hobsbawm com a palavra.


Desde a primeira leitura da “Era das Revoluções”, ingressei no fã clube de Eric Hobsbawm. Em 1966, já sem ilusões em relação ao comunismo, Eric escreve “O Diálogo sobre o Marxismo” que, em 1973, participaria do livro “Revolucionários” (editado no Brasil pela Paz e Terra). No texto, afirma que “uma grande parte do marxismo deve ser repensado e redescoberto”. Hoje, passados 44 anos, o desafio permanece. Selecionei 2 parágrafos que evidenciam os equívocos a que todos nós, ex-membros do “Partidão”, fomos induzidos.
“ Os comunistas vão se dando conta, cada vez mais, de que o que aprenderam a acreditar e a repetir não era simplesmente o “marxismo”, senão o marxismo conforme desenvolvido por Lênin e congelado, simplificado, e às vezes distorcido sob Stalin, na União Soviética. Que o “marxismo” não é um corpo de teorias e descobertas acabadas, mas um processo de desenvolvimento; que o próprio pensamento de Marx, por exemplo, continuou a se desenvolver durante toda sua vida. Que o marxismo tem, sem dúvida, respostas potenciais, mas frequentemente nenhuma resposta efetiva aos problemas concretos que hoje enfrentamos, em parte porque a situação mudou desde Marx e Lênin, em parte porque nenhum dos dois disse nada sobre certos problemas que já existiam em suas épocas e que são importantes para nós.”
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“Não há atalhos para o marxismo: nem o apelo a Lênin contra Stalin, nem a Marx, nem ao jovem Marx contra o Marx da maturidade. Há somente trabalho árduo, longo e, nas atuais circunstâncias, talvez não conducente a conclusões definitivas.”

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Postone. Uma releitura de Marx. Parte 2


Moishe Postone, professor de história da Universidade de Chicago, tem despertado a ira dos marxistas tradicionais. Sua obra “Necessidade, Tempo e Trabalho” está disponível, em português,  em http://obeco.no.sapo.pt/mpt2.htm
Nas primeiras páginas, Postone define o que seria o “Marxismo Tradicional”. Selecionei alguns trechos para estimular a leitura da íntegra do documento:

“Dentro da tradição Marxista, a essência do capitalismo foi geralmente caracterizada em termos de economia de mercado e propriedade privada dos meios de produção. O Socialismo, como sua negação histórica, foi visto – de forma correspondente – em termos de propriedade coletiva dos meios de produção e planejamento econômico.”
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“..........o modo capitalista de propriedade e distribuição deu origem a um novo modo de produção – a produção industrial – a qual criou um grau de riqueza antes impensável, embora distribuída de forma altamente desigual. Contudo, este modo de produção cria as condições da possibilidade de um modo de distribuição novo, justo e conscientemente regulado.”
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“Vê-se a contradição como ocorrendo entre uma capacidade produtiva que, potencialmente, poderia satisfazer as necessidades de consumo de todos os membros da sociedade e relações sócio-econômicas que impedem a efetivação deste potencial.”
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“Separa-se, por um lado, a dominação de classe e a propriedade privada, como específicas do capitalismo e, por outro lado, o trabalho industrial como não-específico e independente do capitalismo. Uma vez aceita esta estrutura, contudo, segue-se que o modo industrial de produção – aquele baseado no trabalho proletário – é visto como historicamente final. Isto leva à noção de socialismo como a continuação linear do modo industrial de produção, o qual foi originado pelo capitalismo; o socialismo como um novo modo de administração política e econômica do mesmo modo de produção.
A esta estrutura teórica básica denomino Marxismo tradicional.”

domingo, 5 de dezembro de 2010

Postone. Uma releitura de Marx. Parte 1


Moishe Postone, professor de história da Universidade de Chicago, tem despertado a ira dos marxistas tradicionais. Vou dedicar algumas postagens às análises do historiador. Pra começar, segue a critica de Denis Collin, quando do lançamento da versão francesa ( 2009) de “Tempo, Trabalho e Dominação Social”.
“ Postone propõe uma reinterpretação de Marx, em oposição radical ao marxismo tradicional, baseado na leitura não integrada dos Grundrisse ( os famosos “manuscritos”, observação minha)  e de O Capital, principalmente o livro 1, primeira secção, consagrada à mercadoria, e a secção IV. Diferentemente dos analistas que usam os Grundrisse em oposição a O Capital (Negri, por exemplo) e daqueles que se dedicam ao Capital e abandonam os Grundrisse, Postone propõe a leitura conjunta das duas obras, tomando os Grundrisse como a “chave” para a interpretação de O Capital.
Postone integra a longa lista de nossos dias daqueles que pretendem livrar Marx do “fardão” do marxismo, que não buscam simplesmente liberar o “verdadeiro Marx”, que não tencionam fazer uma “volta a Marx”, mas apenas iluminar uma leitura fecunda daquele que Michel Henry chama de “um dos maiores filósofos de todos os tempos”.
Para os que gostariam de conhecer, “sem intermediários”, as teses de Moishe Postone, basta acessar www.youtube.com/watch?v=apbqa3TSuZU        e assistir a sua intervenção no Congresso Marx International V, de 2007.


sábado, 4 de dezembro de 2010

Che. Conselhos para o jovem comunista.

Em outubro de 1962, Che Guevara fala, na União dos Jovens Comunistas, sobre como deve ser um jovem comunista. Seguem dois pequenos trechos que explicitam a sua pureza de pensamento:

“Ser um exemplo vivo, ser o espelho onde possam olhar-se os homens e mulheres de idade mais avançada que perderam o entusiasmo juvenil, que perderam a fé na vida e que ante o estímulo do exemplo reagem sempre bem. Eis outra tarefa dos jovens comunistas.
Junto disso, um grande espírito de sacrifício, um espírito de sacrifício não apenas para as jornadas heróicas, mas para todo o momento. Sacrificar-se para ajudar o companheiro nas pequenas tarefas para que possa cumprir o seu trabalho, para que possa cumprir com o seu dever no colégio, no estudo, para que possa melhorar de qualquer maneira. Estar sempre atento a toda a massa humana que o rodeia. “.......................................................................................................................
“O jovem comunista não pode estar limitado pelas fronteiras de um território, o jovem comunista deve praticar o internacionalismo proletário e senti-lo como coisa sua. Lembrar-se, como devemos lembrar-nos todos nós, aspirantes a comunistas cá em Cuba, que somos um exemplo real e palpável para toda a nossa América, para outros países do mundo que lutam também em outros continentes pela sua liberdade, contra o colonialismo, contra o neocolonialismo, contra o imperialismo, contra todas as formas de opressão dos sistemas injustos. Lembrar sempre que somos um facho acesso, que somos o mesmo espelho que cada um de nós individualmente é para o povo de Cuba, e somos esse espelho para que se olhem nele os povos da América, os povos do mundo oprimido, que lutam pela sua liberdade. E devemos ser dignos desse exemplo.”

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O socialista Albert Einstein. Parte 3


Em 1949, Einstein escreve artigo intitulado “Why Socialism?” para o primeiro número  da revista marxista Monthly Review. O texto, na versão original pode ser acessado em www.monthlyreview.org/598einst.htm. Ontem, publiquei a Parte 2. Segue a continuação quando o cientista adverte que  “uma economia planificada pode ser acompanhada pela completa escravização do indivíduo”. Vide o stalinismo, que bombava quando Einstein escreveu o texto.

A situação prevalecente em uma sociedade baseada na propriedade privada do capital está então caracterizada por dois princípios mestres: primeiro, os meios de produção são propriedade de indivíduos, e estes dispõem deles como melhor lhes parecer; segundo, o contrato de trabalho é livre. Supostamente, não existe sociedade capitalista pura, neste sentido. Em particular, deve-se assinalar que os trabalhadores, por meio de grandes e amargas lutas políticas, tem conseguido uma forma um tanto melhorada do “livre contrato de trabalho” para certas categorias de trabalhadores. Mas, tomada como um todo, a economia atual não difere muito do capitalismo “puro”.
Esta mutilação dos indivíduos é o que considero o pior mal do capitalismo. Nosso sistema educativo como um todo sofre este mal. Uma atitude exageradamente competitiva se inculca no estudante, que é treinado para adorar o êxito da aquisição como uma preparação para sua futura carreira.
Estou convencido de que há somente uma forma de eliminar estes graves malefícios: através do estabelecimento de uma economia socialista, acompanhada por um sistema educacional que seja orientado para fins sociais. Em tal economia, os meios de produção são propriedade da própria sociedade e utilizados de maneira planejada. Uma economia planejada, que ajuste a produção às necessidades da comunidade, distribuiria o trabalho entre todos aptos a trabalhar e garantiria os meios de vida de todos, homem, mulher e criança. A educação do indivíduo, além de promover suas próprias habilidades inatas, intentaria desenvolver em um sentido de responsabilidade por seu próximo, em lugar da glorificação do poder e do êxito em nossa sociedade atual.
Sem embargo, é preciso recordar que uma economia planificada não é todavia o socialismo. Uma economia planificada como tal pode ser acompanhada pela completa escravização do indivíduo. A realização do socialismo requer a solução de alguns problemas sócio-políticos extremamente difíceis: “como é possível, considerando a muito abarcadora centralização do poder, conseguir que a burocracia não seja todo poderosa e arrogante? Como podem proteger os direitos do indivíduo e mediante ele assegurar um contrapeso democrático ao poder da burocracia?”
Ter claras as metas e problemas do socialismo é de grande importância nesta época de transição. Dado que, nas circunstâncias atuais, a discussão livre e sem travas destes problemas são um grande tabu, considero a fundação desta revista um importante serviço público.
http://www.marxists.org/portugues/einstein/1949/05/socialismo.htm

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O socialista Albert Einstein. Parte 2


Em 1949, Einstein escreve artigo intitulado “Why Socialism?” para o primeiro número  da revista marxista Monthly Review. O texto, na versão original pode ser acessado em www.monthlyreview.org/598einst.htm. Ontem, publiquei a Parte 1. Segue a continuação quando o cientista fala do controle das fontes de informação pelos “capitalistas privados”:

“O capital privado tende a se concentrar em poucas mãos, em parte devido à competência entre os capitalistas, e em parte porque o desenvolvimento tecnológico e a crescente divisão do trabalho alentam a formação de unidades maiores de produção em detrimento das menores. O resultado destes desenvolvimentos é uma oligarquia do capital privado cujo enorme poder não pode ser controlado efetivamente nem sequer por uma sociedade política democraticamente organizada. Isto é assim porque os membros dos corpos legislativos são selecionados pelos partidos políticos, em grande medida financiados ou de alguma maneira influenciados por capitalistas privados que, por todos efeitos práticos, separam o eleitorado da legislatura. A conseqüência é que os representantes do povo não protegem suficientemente os interesses dos grupos não privilegiados da população. Por outra parte, nas condições atuais os capitalistas privados controlam, direta ou indiretamente, as principais fontes de informação (imprensa escrita, rádio, educação). É então extremamente difícil, e por certo impossível na maioria dos casos, que cada cidadão possa chegar às conclusões objetivas e fazer uso inteligente de seus direitos políticos.
Continua em O socialista Albert Einstein. Parte 3

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

O socialista Albert Einstein. Parte 1


Em 1949, Einstein escreve artigo intitulado “Why Socialism?” para o primeiro número  da revista marxista Monthly Review. O texto, na versão original pode ser acessado em www.monthlyreview.org/598einst.htm. Ou em espanhol no site Rebelion.org. Selecionei um trecho interessante, com tradução de Rodrigo Jurecê Mattos Gonçalves para o marxists internet archive:

“A anarquia econômica da sociedade capitalista de hoje em dia é, em minha opinião, a verdadeira fonte dos males. Vemos diante de nós uma enorme comunidade de produtores cujos membros se esforçam incessantemente em privar o outro dos frutos de seu trabalho coletivo — não pela força mas cumprindo inteiramente as regras legalmente estabelecidas. A este respeito é importante dar-se conta de que os meios de produção — isto é: toda a capacidade produtiva necessária para produzir bens de consumo assim como bens de capital adicionais — podem ser — e em sua maioria o são efetivamente — a propriedade privada de alguns indivíduos.
Para simplificar, na discussão que se segue chamarei “trabalhadores” os que participam na propriedade dos meios de produção, apesar de isto não corresponder ao uso corrente do termo. Usando os meios de produção, o trabalhador produz novos bens que transformam-se em propriedade do capitalista. O ponto essencial deste processo é a relação entre o que o trabalhador produz e o que lhe pagam, ambos medidos em termos de valor real. Em quanto o contrato do trabalho é “livre”, o que o trabalhador recebe está determinado não pelo valor real dos bens que produz mas por suas necessidades mais básicas e pela necessidade de força de trabalho por parte dos capitalistas em relação ao número de trabalhadores competindo por empregos. É importante entender que nem sequer na teoria o salário do trabalhador é determinado pelo valor do que produz.”

Continua em O Socialista Albert Einstein. Parte 2

domingo, 28 de novembro de 2010

Cuidados maternais


O site mundodosfilosofos.com.br/marx.htm relata os cuidados maternais quando o jovem Karl está em Bonn, estudando direito. Escreve mamãe Enriqueta:"Você não deve considerar de modo algum uma fraqueza feminina, se eu agora estiver curiosa para saber como tem administrado sua vida doméstica, se a economia representa também algum papel, o que é uma necessidade inevitável tanto para grandes como para pequenas casas. Permito-me assim observar, querido Karl, que você nunca deve considerar limpeza e ordem coisas secundárias, pois disso depende a saúde e o bem-estar. Observe rigorosamente que seu quarto seja lavado. E lave-se você também, querido Karl, semanalmente com esponja e sabonete." Essa advertência certamente não é sem fundamento, pois as condições sob as quais Marx conduz seus estudos são tudo menos ordeiras: ingressa em uma corporação e, se as notícias sobre isso procedem, é ferido em um duelo. É encarcerado por "perturbar a ordem com alarido noturno e bebedeira". É indiciado por "porte ilegal de arma". Acumula dívida sobre dívida.

O Poeta Marx parte 2


Já postamos aqui poesia do jovem Marx para sua paixão Jenny, a futura e sofrida esposa.
O site mundodosfilosofos.com.br/Marx.htm faz referencia a alguns títulos de poemas altamente líricos: "Canto dos elfos", "Canto dos gnomos" ou "Canto das sereias", segundo o texto “fúteis cantilenas mitológicas”
E reproduz algumas estrofes da triste “Tragédia do Destino”:
"A menina está ali tão reservada,
tão silente e pálida;
a alma, como um anjo delicada,
está turva e abatida...
Tão suave, tão fiel ela era,
devotada ao céu,
da inocência imagem pura,
que a Graça teceu.
Aí chega um nobre senhor
sobre portentoso cavalo,
nos olhos um mar de amor
e flechas de fogo.
Feriu-a no peito tão fundo;
mas ele tem de partir,
em gritos de guerra bramando:
nada o pode impedir".

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Marx era realmente marxista


Na “comemoração” do centenário da morte de Marx, em 1983, a Federação Anarquista da França publicou uma edição especial da revista Cultural e Literária de Expressão Anarquista LA RUE. Com o titulo acima, Michel Ragon ensaia uma venenosa biografia do alemão. Denuncia, inclusive, que Marx teria engravidado a empregada que era “propriedade” da família desde os 8 anos e que jamais reconhecerá o filho bastardo. Mas, o trecho mais provocante do artigo é o último parágrafo, quando profetiza a morte do marxismo:

“O marxismo morrerá com a sociedade industrial e comercial que o fez nascer e da qual é a expressão analítica, assim como morreram o saint-simonismo e o positivismo. Não são esses os três avatares  da sociedade burguesa do século XIX ? O mito cientificista dirigido para a produção acelerada, que vai dos politécnicos saint-simonianos aos tecnocratas marxistas, resultou na criação de duas formas de sociedades que se dizem antagonistas e se fundam, realmente, sobre os mesmos critérios. São elas: sociedades capitalistas e sociedades marxistas.”

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O Caminho para o Leninismo.


Em abril de 1960, na comemoração dos 90 anos de nascimento de Lênin, Ho Chi Minh conta a sua iniciação no Leninismo, em texto de ingenuidade comovente – ““O Caminho que me levou ao Leninismo”.
Seguem os 3 parágrafos iniciais. Para ler a íntegra, em português, acesse www.marxists.org/portugues/ho_chi_minh/1960/04/leninismo.htm

“Após a Primeira Guerra Mundial, eu levava minha vida em Paris, ora como retocador de fotografias, ora como pintor de “antiguidades chinesas” (feitas na França). Também distribuía panfletos denunciando os crimes cometidos pelos colonizadores franceses no Vietnã.
            Naquele tempo, eu apoiava a Revolução de Outubro apenas por intuição, não tendo em mente ainda toda sua importância histórica. Eu amava e admirava Lênin porque ele era um grande patriota que libertara seus compatriotas; até então, eu não havia lido nenhum de seus livros.
            A razão para eu ter me unido ao Partido Socialista Francês foi porque essas “damas e cavalheiros” – como eu chamava meus camaradas na época – demonstraram sua simpatia por mim, pela luta dos povos oprimidos. Mas eu não entendia o que era um partido, um sindicato, nem mesmo socialismo ou comunismo.”

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

"A religião é o suspiro da criatura oprimida."


Buscar identidades entre comunismo e cristianismo é tema recorrente. A primeira vez que testemunhei uma defesa ardorosa de que a cristianismo seria um precursor do comunismo foi em minha primeira visita a Salvador, na flor de meus 16 anos. A tese era de um comuna velho – confesso que não guardei o nome – que morava na Avenida  Sete, junto ao Campo Grande. Nos anos seguintes, li alguns artigos que ensaiavam esse malabarismo. Navegando no conflittiestrategie.splinder.com deparei com um texto interessante que retoma o texto e resolvi traduzir, com o meu precaríssimo italiano, os dois parágrafos iniciais. Para quem se interessar de ler a íntegra, em italiano, segue o endereço no final do texto abaixo.

“O comunismo e o cristianismo (pelo menos na primeira fase do "cristianismo primitivo"), foram ambos  movimentos das classes mais baixas. Em certo sentido, pode-se dizer que a religião em si é mais uma característica das classes mais baixas. "A religião é o suspiro da criatura oprimida", na visão crítica de Marx (uma crítica que, em termos hegelianos, é superação e não negação) consistia em transformar esse suspiro em uma atitude social através da adoção de instrumentos políticos e teóricos ajustados ao escopo.

No entanto, existem profundas diferenças entre o comunismo marxista e o cristianismo. O marxismo é fortemente orientado para o conhecimento da realidade histórica e social, enquanto o cristianismo, no nível cognitivo,  marca uma regressão, mesmo se comparado com as filosofias dominantes no momento em que surgiu - o estoicismo e o epicurismo - tendo prevalecido nas necessidades subjetivas, o que provocou uma fratura  entre o ser  e  mundo.”
Para ler a íntegra do texto, em italiano, acesse  http://conflittiestrategie.splinder.com/post/23637655#more-23637655


terça-feira, 23 de novembro de 2010

A morte necessária


Um texto, com aparente toque de ingenuidade no site italiano conflitiestrategie.splinder.com – para onde migrou o “ripensare marx – dedicado a uma reflexão sobre comunismo versus cristianismo encerra com uma frase que merece uma reflexão:
“L'ideale comunista ha consumato la sua funzione storica, perché da esso possano nascere altri ideali bisogna che muoia definitivamente.”
Minha tradução “livre”:
“O ideal comunista consumou o seu papel histórico. Sua morte é conditio sine qua para que outros ideais possam nascer.”
Amanhã Parte 2

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O "Juízo Final" de Astrojildo Pereira


Conheci  Astrojildo Pereira no meu tempo de Partidão. Fundador do PCB e seu 1º Secretário Geral era um figuraço. O texto a seguir é a parte final de uma de suas “Crônicas Subversivas”, escrito em 29 de junho de 1918, nos “finalmentes” da 1ª Guerra.
“Porque eu espero que o juízo final chegue também por cá, por estes Brasis amados. Ah! não me sai da mente esta luminosa idéia: subir as escadas do Catete e pegar pela gola o patife que lá estiver a presidir e arremessá-lo das janelas do segundo andar, a esborrachar-se integralmente no asfalto...”

Esquerda X Direita. Como o eleitor identifica o político?


O eleitor médio tem grande dificuldade em classificar um político como esquerda ou direita. Me recordo de uma pesquisa quali conduzida, salvo engano, pela Vera Aldrighi logo após a mega votação do Doutor Enéas. Os grupos integrados por eleitores do Enéas o classificavam, em sua maioria esmagadora, como “de esquerda”.
Em fevereiro de 2008, o IPSOS, então dirigido pelo Alberto Carlos Almeida, pediu aos entrevistados que classificassem os políticos em Direita, Esquerda e Centro. Vejam os percentuais, nessa ordem:
Lula ................20,1%, 28,9% e 12,2%
Alckmim.......... 31,0%,12,5% e 15,4%
Heloisa Helena 9,3%, 31,5% e 16,3 %
Aécio.............. 17,4%, 14,9% e 16,1%
Serra............... 25,4%, 14,4% e 17,1%

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Democracia hoje. O conceito de Touraine.


O tema inesgotável “ o que é democracia, hoje?” recebeu uma boa contribuição do sociólogo Alain Touraine, na flor de seus 85 anos, em entrevista a O Globo, em 15/11/10.
“Ninguém sabe o que significa democracia hoje, cada um tem a sua definição. Para mim, democracia é ampliar o acesso a todos os serviços e bens básicos, como educação e saúde, entre outras coisas. É possível reconstruir uma sociedade baseada em termos não sociais universais, tais como ecologia e direitos individuais. Sou um grande defensor da ideia de universalização. É fundamental reconhecer e garantir valores universais como, por exemplo, a liberdade religiosa. Recriar formas de vida coletiva e privada baseadas em princípios universais.”

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A Teoria Marxista é "Finita".


Texto de Louis Althusser redigido em fins de 1977, foi publicado originariamente no jornal Il Manifesto, em 4 de abril de 1978.

“ Eu creio que a teoria marxista é "finita", limitada: que ela é limitada à análise do modo de produção capitalista, e de sua tendência contraditória, que abre a possibilidade da passagem para a abolição do capitalismo e sua substituição por "outra coisa", que se delineia já "como um vazio" e positivamente, na sociedade capitalista. Dizer que a teoria marxista é "finita" significa sustentar a idéia essencial de que a teoria marxista é totalmente distinta de uma filosofia da história, que pretenda "englobar" todo o devenir da humanidade pensando-o efetivamente, e que seria, portanto, capaz de definir, antecipadamente e de modo positivo, o seu fim: o comunismo. A teoria marxista (se deixa de lado a tentação de uma filosofia da história, à qual o próprio Marx às vezes cedeu, e que dominou de modo esmagador a Segunda Internacional e o período stalinista) está inscrita na fase atual existente, e é limitada a ela: a fase da exploração capitalista. Tudo que ela pode dizer do futuro é o prolongamento alusivo e em negativo da possibilidade objetiva de uma tendência atual, a tendência ao comunismo, que pode ser observada em toda uma série de fenômenos da sociedade capitalista (da socialização da produção às formas sociais "intersticiais"). É preciso observar que é a partir da sociedade atual que pode ser pensada a transição (ditadura do proletariado, sob a condição de não se desvirtuar instrumentalmente esta expressão) e a extinção ulterior do Estado. Tudo o que se diz sobre a transição só pode ser uma indicação induzida por uma tendência atual que, como toda tendência em Marx, é contraposta a outras tendências e só pode se realizar por meio de uma luta política. Porém, esta realidade não pode ser prevista já na sua forma positiva determinada: é apenas no curso da luta que as formas positivas podem aparecer à luz do dia, se descobrir, se tornar realidade.
Conseqüentemente, a idéia de que a teoria marxista é "finita" exclui totalmente a idéia de que ela seja uma teoria "fechada". Fechada é a filosofia da história, na qual está antecipadamente contido todo o curso da história. Somente uma teoria "finita" pode ser realmente "aberta" às tendências contraditórias que descobre na sociedade capitalista, e aberta ao seu devenir aleatório, aberta às imprevisíveis "surpresas" que sempre marcaram a história do movimento operário; aberta, portanto atenta, capaz de levar a sério e assumir em tempo a incorrigível imaginação da história.
Creio, assim, que devemos recusar completamente a idéia, que se encontra ainda em certas expressões de Lenin, e também de Gramsci, de que a teoria marxista é uma teoria "total", similar a uma filosofia da história que culmina em uma prática do Saber absoluto, e capaz de pensar problemas que "não estão na ordem do dia", antecipando arbitrariamente as condições de sua solução. Se a teoria marxista é verdadeiramente "finita", é a partir da profunda consciência de sua finitude que é possível colocar a maior parte dos nossos grandes problemas.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Carta de Prestes aos comunistas


Em março de 1980, Prestes decide romper com a direção do PCB e escreve uma longa e exaustiva Carta de rompimento. O último parágrafo resume bem o bla-bla-bla do velho capitão:

“Companheiros e amigos!
Esta carta constitui como que a reafirmação da confiança que tenho nos comunistas e na classe operária, na sua capacidade de reflexão sobre a grave situação que atravessa o PCB. Chegou o momento em que é indispensável que os comunistas rompam com a passividade e tomem os destinos do PCB em suas mãos, rebelando-se contra as arbitrariedades e os métodos mandonistas de direção, e tratando de eleger, em todos os níveis partidários, direções que realmente sejam a expressão democrática da maioria dos comunistas. Penso ter evidenciado o quanto tem de excepcional a situação que me levou a formular este apelo a todos os comunistas para iniciar um processo de mudanças radicais que deverá ser coroado com a discussão e aprovação democráticas de uma orientação verdadeiramente revolucionária e a eleição também democrática de um novo tipo de direção à altura desta nova orientação.
Rio de Janeiro, março de 1980.
Luiz Carlos Prestes”

A notícia de uma morte não confirmada


Em 18 de maio de 1883, domingo, o jornal “O Protesto Operário” – órgão do Partido Operário Socialista, de Portugal – publica a notícia, não confirmada, da morte de Marx.
(Transcrição segundo a ortografia da época)
Um tellegrama de Paris anuncia o fallecimento do grande pensador socialista Karl Marx. Permittam-nos a agencia Havas e os jornaes burguezes que publicam a noticia, que duvidemos da veracidade do facto, não por que o achemos extranho, mas por que o não podemos acreditar sem comunicação official. Sabemos a avidez com que os repporters inventam noticias de sensação, e esta é uma d´aquellas que nos allucina, que nos confunde, só ao pensar na perda do Mestre. Além d´isso sabemos que Marx habitava ultimamente Londres e não tivemos noticia da sua partida para Paris.
A ser verdadeira aquella participação, o socialismo universal, a sciencia, a humanidade, terão a lamentar o desapparecimento da intelligencia mais potente da civilisição moderna. Não é preciso que só nós o digamos; dil-o um jornal burguez nas seguintes phrazes que transcrevemos:
«Era, por ventura, o primeiro vulto do socialismo, e, sem duvida, uma das mais notaveis intelligencias do seculo. O seu livro «O Capital», pela profundeza de vistas, pelo rigor penetrantissimo do raciocínio, pela vastidão do seu plano admiravelmente cumprido, é uma obra suprema, é o mais luminoso dos trabalhos que em materia economica se tem feito.
Foi tambem importantissimo o papel de Karl Marx como homem de acção, como instigador secreto do movimento socialista».
Esperamos anciosos por informações fidedignas.

O papel da Ciência e dos cientistas


Paul Lafargue, casado com Laura, filha de Marx, relata em “Recordações Pessoais sobre Karl Marx” que viu o sogro pela primeira vez em fevereiro de 1865 e o achou profundamente debilitado. Na época, ele trabalhava no volume I de O Capital. Paul dedica parte do texto a expor a relação de Marx com a ciência e o papel dos cientistas:
Marx é um desses raros seres que ocupam, ao mesmo tempo, o primeiro plano na ciência e na vida pública. De tal maneira ele exercia essas duas atividades, que era difícil saber o que se projetava em primeiro lugar: se o homem de ciência ou o lutador socialista. Considerando que toda a ciência deve ser cultivada por si mesma e que nas investigações científicas jamais se deve temer as conclusões a que se pode chegar, ele era da opinião de que, se o homem de ciência não quiser ocupar um plano secundário, deve participar incessante e ativamente da vida pública, sem fazer do seu gabinete de trabalho ou do seu laboratório um esconderijo, antes se atirando às lutas sociais e políticas de sua época.”
“A ciência não deve significar apenas um prazer egoístico”, dizia Marx. “Os que têm a oportunidade de se consagrar aos estudos científicos deverão ser os primeiros a pôr seus conhecimentos a serviço da humanidade.” Uma de suas frases favoritas era: “Trabalhar pela humanidade”.

Um jovem poeta apaixonado


O jovem Marx apaixonado pela namorada Jenny  declara, em versos, que poderia preencher milhares de volumes escrevendo apenas Jenny, em cada linha. E encerra proclamando que “Amor é Jenny, Jenny é o nome do amor”. Veja a tradução para o ingles.
See! I could a thousand volumes fill,
    Writing only “Jenny” in each line,
Still they would a world of thought conceal,
Deed eternal and unchanging Will,
Verses sweet that yearning gently still,
    All the glow and all the ether’s shine,
    Anguished sorrow’s pain and joy divine,
    All of Life and Knowledge that is mine.
I can read it in the stars up younger,
    From the Zephyr it comes back to me,
From the being of the wild waves’ thunder.
Truly, I would write it down as a refrain,
    For the coming centuries to see —
LOVE IS JENNY, JENNY IS LOVE’s NAME.

O poeta Marx


A produção poética de Marx está concentrada em duas figuras inspiradoras, seu pai (12 poemas) e Jenny von Westphalen, sua mulher ( 53 poemas). O período “produtivo” teria sido  1836/37, na flor de seus 18/19 anos. Sua filha Laura Lafargue teve acesso aos manuscritos após a morte do pai e encontrou a dedicatória “Para minha querida e sempre amada Jenny von Westphalen”. Alguns versos seus foram encontrados em caderno de Sophie, sua irmã mais velha.
A seguir um dos poemas dedicado a Jenny, traduzido para o inglês (não me arrisco a traduzir poemas).

THE FIDDLER

The Fiddler saws the strings,

His light brown hair he tosses and flings.

He carries a sabre at his side,

He wears a pleated habit wide.

"Fiddler, why that frantic sound?

Why do you gaze so wildly round?

Why leaps your blood, like the surging sea?

What drives your bow so desperately?"

"Why do I fiddle? Or the wild waves roar?

That they might pound the rocky shore,

That eye be blinded, that bosom swell,

That Soul’s cry carry down to Hell."

"Fiddler, with scorn you rend your heart.

A radiant God lent you your art,

To dazzle with waves of melody,

To soar to the star-dance in the sky."

"How so! I plunge, plunge wihout fail

My blood-black sabre into your soul.

That art God neither wants nor wists,

It leaps to the brain from Hell’s black mists.

"Till heart’s bewitched, till senses reel:

With Satan I have struck my deal.

He chalks the signs, beats time for me,

I play the death march fast and free.

"I must play dark, I must play light,

Till bowstrings break my heart outright."

The Fiddler saws the strings,

His light brown hair he tosses and flings.

He carries a sabre at his side,

He wears a pleated habit wide.

From the Book of Love (Part I)


sábado, 6 de novembro de 2010

Babeuf. "O primeiro comunista ativista".


Fui apresentado a Gracchus Babeuf pelo deputado Alessandro Molon em seu livro
“Graco Babeuf. O Pioneiro do Socialismo Moderno” publicado pela editora UERJ, em 2002.
Marx considerava Babeuf o “primeiro comunista ativista” e a Conjuração do Iguais o "primeiro partido comunista". Para Rosa de Luxemburgo, Babeuf é "o primeiro precursor dos levantes revolucionários do proletariado".
Para conhecer um pouco mais de Babeuf, vale a leitura do livro do deputado Molon – recém eleito o deputado federal mais do votado do PT no RJ. Para estimular a leitura segue uma minibiografia do revolucionário, transcrita do site marxists.org

"Quando o governo viola os direitos do povo, a insurreição é, para o povo e para cada porção do povo, o mais sagrado dos direitos e o mais indispensável dos deveres."  Gracchus Babeuf


François Noël Babeuf, conhecido como Gracchus Babeuf nasceu em Saint-Quentin, Picardia em 23 de novembro de 1760 foi sucessivamente servo doméstico, artesão, pedreiro e depois encarregado dos registros (contabilidade) de uma propriedade senhorial.
Publica em 1790 “O Cadastro Perpétuo”, em que defende as reivindicações de igualdade radical do povo de Paris. Várias vezes preso e solto por causa de suas posições. Fez-se chamar Gracchus em referência a dois irmãos romanos que militaram a favor da reforma agrária e foram assassinados (133 e 121 antes de Cristo).
Funda em 1794 o jornal “A Tribuna do Povo” e cria em 1795 a Sociedade dos Iguais com Buonarroti. Face ao aumento da reação “thermidoriana”, essa sociedade reivindica a aplicação da constituição de 1793, que adicionou emendas à de 1789. As emendas em questão são sobretudo concessões às reivindicações populares: direito à educação, à assistência pública.
Preso em 1796, Babeuf é executado em maio de 1797, após uma tentativa de suicídio.

Conheça a íntegra do Manifesto dos Iguais em:


sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Imposto de Renda Progressivo e o Manifesto



Os acertos finais do “Manifesto” foram feitos em janeiro de 1848. É certo que suas teses não produziram nenhum efeito significativo nos tempos revolucionários que se seguiram, mas é incontestável que, além de captar a “alma” daquele momento, ele avançou no tempo. Vale relembrar a análise de Paul Strathern em sua “Breve História da Economia”(Jorge Zahar Editores).
“….Marx de fato propõe uma lista de reformas no Manifesto. Há algumas, como o imposto de renda progressivo, a abolição do trabalho infantil em fábricas e a educação gratuita para todas as crianças, que hoje aceitamos como norma. Outras, como a abolição da propriedade privada e o estabelecimento de um monopólio estatal em áreas como atividades bancárias, comunicações, transportes e todas as formas de produção, foram tentadas – e fracassaram, em geral de maneira catastrófica.”

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A Comuna de Paris e a ditadura do proletariado


“ O filisteu alemão foi recentemente tomado de um terror salutar ao ouvir pronunciar a expressão ditadura do proletariado. Pois bem, senhores, quereis saber qual é o aspecto dessa ditadura? Olhai a Comuna de Paris. Era a ditadura do proletariado.” Engels, na introdução da “Guerra Civil em França”.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

As muralhas da China e o stalinismo


“Acertadamente, Marx previu que o capitalismo destruiria até as muralhas da China, obrigando todos os povos periféricos ao sistema a adotarem, sob pena de perecimento, o modo burguês de produção. Mas a forma como isso se deu nas diferentes regiões do planeta desrespeitou toda lei e toda lógica. Da mesma forma que os liberais americanos dos séculos XVIII e XIX foram capazes de conservar a escravidão com vistas a acumular o necessário para garantir as condições da futura ordem capitalista, os stalinistas soviéticos do século XX foram capazes de exacerbar o despotismo oriental com essa mesma finalidade”
Extraído de “Em defesa do socialismo” livreto do atual Ministro da Educação, Fernando Haddad, publicado em 1998 para comemorar os 150 anos do Manifesto Comunista. É provável que se o Ministro fosse reescrever o texto hoje, reconheceria que a própria China adotou, sob pena de perecimento, a conciliação do “modo burguês de produção” com o “despotismo oriental”......