sábado, 29 de outubro de 2011

Marx "infesta" Proudhon de Hegel. Parte 2


Na mesma carta a Schweitzer (1865) onde Marx descreve a polêmica com Proudhon segue mais um trecho de dura  critica à “dialética de Proudhon”.

“Proudhon pendia por natureza para a dialética. Mas, uma vez que ele nunca compreendeu a dialética realmente científica, apenas a reduziu a sofística. De fato, isso coincidia com o seu ponto de vista pequeno-burguês. O pequeno-burguês é tal como o historiador Raumer (1781-1873): composto de «por um lado...» e de «por outro lado...» É assim nos seus interesses econômicos e, portanto, [também] na sua política, nas suas visões religiosas, científicas e artísticas. E assim na sua moral, é assim in everything. Ele é a contradição viva. Se, além disso, como Proudhon, for um homem rico de espírito, em breve aprenderá a jogar com as suas próprias contradições e a elaborá-las, segundo as circunstâncias, em paradoxos vistosos, ruidosos, umas vezes escandalosos, outras vezes brilhantes. Charlatanismo científico e acomodação política são inseparáveis de um tal ponto de vista. Resta apenas um motivo impulsionador, a vaidade do sujeito, e trata-se, como com todos os vaidosos, apenas do sucesso do momento, da sensação do dia. Assim se extingue necessariamente o simples tato moral que, por exemplo, sempre manteve afastado um Rousseau mesmo de qualquer compromisso aparente com os poderes existentes.”

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Marx "infesta" Proudhon de Hegel.Parte 1,


Avaliar a real relação dos diversos “momentos” da vida de Marx com a doutrina de Hegel é tarefa para marxólogo ( não vale marxistas) de alto nível.
Norberto Bobbio transcreve trecho de uma carta de 1865 a Schweitzer onde Marx descreve a polêmica com Proudhon.
“ Durante minha permanência em Paris, em 1844, conheci Proudhon pessoalmente. Recordo esta circunstância porque até certo ponto sou responsável por sua sophistication, palavra usada pelos ingleses para designar a contratação de uma mercadoria. Em longas discussões, que se estendiam, frequentemente, por toda a noite, eu o infestava de hegelianismo para seu grave prejuízo, já que ele, por não conhecer o alemão, não podia estudar a coisa a fundo.”

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O "Manifesto" com prefácio de Engels.


Em junho de 1883, três meses após a morte de Marx ( 14 de março) Engels assina sozinho o prefácio à edição alemã do Manifesto:

“Tenho, infelizmente, de assinar sozinho o prefácio à presente edição. Marx, o homem a quem toda a classe operária da Europa e da América deve mais do que a qualquer outro —, Marx repousa no cemitério de Highgate, e sobre o seu túmulo cresce já a primeira erva Depois da sua morte já não se pode mais falar de uma refundição ou complemento do Manifesto. Pelo que considero tanto mais preciso afirmar aqui de novo, expressamente, o seguinte:
O pensamento fundamental que percorre o Manifesto: que a produção econômica, e a articulação social que dela com necessidade decorre, de qualquer época histórica forma a base da história política e intelectual dessa época; que, consequentemente, toda a história (desde a dissolução da antiquíssima posse comum do solo) tem sido uma história de lutas de classes, lutas entre classes exploradas e exploradoras, dominadas e dominantes, em diversos estágios do desenvolvimento social; que esta luta, porém, atingiu agora um estágio em que a classe explorada e oprimida (o proletariado) já não se pode libertar da classe exploradora e opressora (a burguesia) sem simultaneamente libertar para sempre a sociedade toda da exploração, da opressão e das lutas de classes — este pensamento fundamental pertence única e exclusivamente a Marx.
Já afirmei isto muitas vezes; mas é necessário, precisamente agora, que esta afirmação preceda o próprio Manifesto.
Londres, 28 de Junho de 1883.
F. Engels


domingo, 23 de outubro de 2011

Proudhon X Marx. Liberdade X Escravatura.


Em 28 de dezembro de 1846, Marx escreve a Pavel Annenkov para comentar o “Filosofia da Miséria”, de Proudhon. Começa a carta se desculpando pela demora na resposta à missiva de 1º de novembro, pois seu livreiro demorou para enviar a publicação ( em francês). Informa que leu o livro em dois dias para comunicar imediatamente a sua opinião, mas que poderá entrar em pormenores em uma segunda correspondência. Selecionei um trecho, muito crítico, em que ele faz uma rápida referência ao Brasil e afirma que “Sem a escravatura, a América do Norte, o povo mais progressivo, transformar-se-ia num país patriarcal”.

“A liberdade e a escravatura formam um antagonismo. Não preciso falar dos lados bons nem dos lados maus da liberdade.
Quanto à escravatura, não preciso falar dos seus lados maus. A única coisa que é preciso explicar é o lado belo da escravatura. Não se trata da escravatura indireta, da escravatura do proletário, trata-se da escravatura direta, da escravatura dos Negros no Suriname, no Brasil, nas regiões meridionais da América do Norte.
A escravatura direta é o eixo de nosso atual sistema industrial, tal como as máquinas, o crédito, etc. Sem escravatura, não temos algodão; sem algodão, não temos indústria moderna. Foi a escravatura que deu valor às colônias, foram as colônias que criaram o comércio mundial, o comércio mundial é que é a condição necessária da grande indústria mecânica. Por isso, antes do tráfico dos negros, as colônias só davam ao velho mundo muito poucos produtos e não alteravam visivelmente a face do mundo. Assim, a escravatura é uma categoria econômica da mais alta importância. Sem a escravatura, a América do Norte, o povo mais progressivo, transformar-se-ia num país patriarcal. Risque-se apenas a América do Norte do mapa dos povos e ter-se-á a anarquia, a decadência completa do comércio e da civilização modernos. Mas fazer desaparecer a escravatura seria riscar a América do mapa dos povos. Por isso a escravatura, sendo uma categoria econômica, se encontra desde o começo do mundo em todos os povos. Os povos modernos só souberam disfarçar a escravatura no seu próprio seio e importá-la abertamente no Novo Mundo. Como abordará isto o bom do sr. Proudhon  depois destas reflexões sobre a escravatura? Procurará a síntese da liberdade e da escravatura, o verdadeiro meio termo; por outras palavras: o equilíbrio da escravatura e da liberdade.
O sr. Proudhon compreendeu muito bem que os homens fazem o pano, a tela, os tecidos de seda; que grande mérito ter compreendido tão pouca coisa! O que o sr. Proudhon não compreendeu é que os homens, segundo as suas faculdades, produzem também as relações sociais em que produzem o pano e a tela. Menos ainda compreendeu o sr. Proudhon que os homens, que produzem as relações sociais em conformidade com a sua produtividade material, produzem também as ideias, as categorias, isto é, as expressões abstratas ideais [idéelles] dessas mesmas relações sociais. Assim, as categorias são tão pouco eternas quanto as relações que exprimem. São produtos históricos e transitórios. Para o sr. Proudhon, muito pelo contrário, a causa primitiva são as abstrações, as categorias. Segundo ele, são elas e não os homens que produzem a história. A abstração, a categoria tomada como tal, isto é, separada dos homens e da sua ação material, é naturalmente imortal, inalterável, impassível; é apenas um ser da razão pura, o que só quer dizer que a abstração tomada como tal é abstrata. Tautologia admirável!. “

sábado, 22 de outubro de 2011

Comunismo:"um sonho muito bonito para esse mundo mau".


Em dezembro de 1847, ainda em Bruxelas, Marx comenta uma carta publicada por Lamartine – Marie-Louis-Alphonse Prat de Lamartine, Ministro dos Negócios Estrangeiros da França.  Classifica Lamartine como “socialista poético” e faz referencia a um desafio proposto por Etienne Cabet, um defensor do “comunismo utópico passivo”.

Mais uma vez, os jornais franceses publicam uma carta do Sr. de Lamartine Dessa vez, é sobre o comunismo que esse socialista poético dá sua cândida opinião após ter sido desafiado a fazê-lo por Cabet. Ao mesmo tempo, Lamartine prometeu expor suas visões, detalhadamente, acerca desse “assunto importante” em um futuro próximo. Por agora, ele se contenta com breve sucinto discurso profético:
“Minha opinião acerca do comunismo”, ele afirma, “pode ser resumida no seguinte sentimento (!): se Deus confiasse a mim uma sociedade de selvagens para civilizá-los e fazê-los pessoas de boas maneiras, a primeira instituição que eu os daria seria a da propriedade.”
“O fato”, continua o Sr. Lamartine, “de que o homem apropria os elementos para si é uma lei da natureza e uma precondição da vida. O homem apropria o ar através da respiração, o espaço ao andar por ele, a terra ao cultivá-la, e até mesmo, através de sua própria perpetuação pelos seus filhos; a propriedade é a organização do princípio da vida no universo; comunismo seria a morte do trabalho e da humanidade como um todo.”
“Seu sonho”, o Sr. Lamartine finalmente consola o Sr. Cabet  “é muito bonito para essa Terra.”
O Sr. Lamartine é, assim, um oponente do comunismo e não somente do sistema comunista; na verdade, ele entra na lista que defende a “perpetuidade da propriedade privada”. O seu “sentimento” diz a ele três coisas:
que a propriedade civiliza as pessoas;
que ele é a organização do princípio da vida no mundo; e
que o seu oposto, comunismo, é um sonho muito bonito para esse mundo mau.”

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Marx seduzido por Ricardo. Parte 2

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Delfim Netto não está isolado quando proclama a sedução de Marx por Ricardo. Marxistas mais “puros” declaram expressamente que Marx absorveu a teoria econômica ricardiana , tendo, simplesmente, anexado a ela  a  dialética de Hegel.  O próprio Gramsci reconheceu : “Parece-me que, em certo sentido podemos dizer que a filosofia da práxis ( ou seja , o marxismo) é igual a Hegel + David Ricardo (.....) Ricardo deve ser  associado com Hegel e Robespierre”.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Marx seduzido por Ricardo

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Mais uma vez, Delfim Netto recorre a Marx para iluminar sua coluna semanal no jornal Valor Econômico – toda terça-feira, na página 2. Na coluna de 18/10/11, o professor emérito da FEA-USP, discorre sobre a relação “homem e trabalho” – “O homem , ao construir o mundo com seu trabalho, exerce uma pressão seletiva o sentido de aumentar a sua liberdade de expressão, o que exige cada vez maior eficácia produtiva.” No segundo parágrafo, faz uma estimulante reflexão sobre a sedução de Marx por Ricardo: “Uma das construções mais impressionantes de Marx é a sua leitura do papel do trabalho nos “Manuscritos” de 1844, antes dele ter sido seduzido por Ricardo.”

domingo, 16 de outubro de 2011

Filosofia: a religião trazida para o pensamento?

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Em 1844, Marx elabora os clássicos “Manuscritos Econômico-Filosóficos”. Selecionei um trecho do Terceiro Manuscrito - Crítica da Filosofia Dialética e Geral de Hegel – onde o jovem Marx (26 anos) revela o seu desprezo pela filosofia ao destacar como grande contribuição de Feuerbach ter demonstrado que a filosofia nada mais seria “do que a religião trazida para o pensamento e desenvolvida por este, devendo ser igualmente condenada como outra forma e modo de existência da alienação humana”. Vale lembrar aqui a agressiva frase de Marx , em idade mais avançada: “A filosofia está para o saber real como o onanismo para o sexo”. O surrealismo de todo esse feroz preconceito é que o velho Karl foi, sem dúvida, um grande filósofo........
No prefácio dos “Manuscritos”, Marx afirma que ainda não teria sido feita, até então, uma exposição crítica da dialética hegeliana: “Ao contrário dos teólogos críticos de nossa época, considerei o capítulo final do presente trabalho, uma exposição crítica da dialética hegeliana e de sua filosofia geral, como absolutamente essencial, pois isso ainda não foi feito. Esta falta de meticulosidade não é acidental, pois o teólogo crítico continua a ser um teólogo. Ele tem de partir, seja de certos pressupostos da filosofia aceita como oficial, ou então, se no decurso da crítica e como resultado de descobertas de outras pessoas surgirem-lhe na mente dúvidas acerca dos pressupostos filosóficos, abandona-os de forma covarde e sem justificativa, abstrai a partir deles, e demonstra ao mesmo tempo dependência servil face a elas e seu ressentimento a essa dependência de maneira negativa, inconsciente e sofística.”
E no trecho final exalta Feuerbach como a única pessoa que tem uma relação séria e critica com a dialética de Hegel e que efetuou descobrimentos verdadeiros nesse campo e, acima de tudo, levou de vencida a velha filosofia.
“A grandeza do feito de Feuerbach e a modesta simplicidade com que apresenta sua obra ao mundo, contrastam incrivelmente com a conduta de outros.
A grande realização de Feuerbach é:
(1) ter mostrado a filosofia nada mais ser do que a religião trazida para o pensamento e desenvolvida por este, devendo ser igualmente condenada como outra forma e modo de existência da alienação humana;
(2) ter lançado os fundamentos do materialismo genuíno e da ciência positiva, ao fazer da relação social de "homem com homem" o principio básico de sua teoria;
(3) ter-se oposto à negação da negação que alega ser o positivo absoluto um princípio auto-suficiente, positivamente baseado em si mesmo.”

sábado, 15 de outubro de 2011

O socialismo fracassou e o capitalismo quebrou. O que virá a seguir?

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Artigo de Hobsbawm, no The Guardian, tenta responder a pergunta acima.
A prioridade seria não o aumento do lucro e do consumo, mas a ampliação das oportunidades e capacidades de todos por meio da ação coletiva. Isso significa iniciativa pública sem fundamento na busca do lucro. Decisões orientadas para as melhorias sociais coletivas, com ganho para todos. Hobsbawm encerra o texto tomando como exemplos Londres e a crise do meio ambiente.

“Tomemos o caso de Londres. É evidente que importa a todos nós que a economia de Londres floresça. Mas a prova de fogo da enorme riqueza gerada em algumas partes da capital não é que tenha contribuído com 20 ou 30% do PIB britânico, mas sim como afetou a vida de milhões de pessoas que ali vivem e trabalham. A que tipo de vida têm direito? Podem se permitir a viver ali? Se não podem, não é nenhuma compensação que Londres seja um paraíso dos muito ricos. Podem conseguir empregos remunerados decentemente ou qualquer tipo de emprego? Se não podem, de que serve jactar-se de ter restaurantes de três estrelas Michelin, com alguns chefs convertidos eles mesmos em estrelas. Podem levar seus filhos à escola? A falta de escolas adequadas não é compensada pelo fato de que as universidades de Londres podem montar uma equipe de futebol com seus professores ganhadores de prêmios Nobel.
A prova de uma política progressista não é privada, mas sim pública. Não importa só o aumento do lucro e do consumo dos particulares, mas sim a ampliação das oportunidades e, como diz Amartya Sen, das capacidades de todos por meio da ação coletiva. Mas isso significa – ou deveria significar – iniciativa pública não baseada na busca de lucro, sequer para redistribuir a acumulação privada. Decisões públicas dirigidas a conseguir melhorias sociais coletivas com as quais todos sairiam ganhando. Esta é a base de uma política progressista, não a maximização do crescimento econômico e da riqueza pessoal.
Em nenhum âmbito isso será mais importante do que na luta contra o maior problema com que nos enfrentamos neste século: a crise do meio ambiente. Seja qual for o logotipo ideológico que adotemos, significará um deslocamento de grande alcance, do livre mercado para a ação pública, uma mudança maior do que a proposta pelo governo britânico. E, levando em conta a gravidade da crise econômica, deveria ser um deslocamento rápido. O tempo não está do nosso lado.”


sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A crise de 2008 e os 150 anos do Manifesto.


Eric Hobsawm, em entrevista concedida a  Marcelo Musto e publicada em Carta Maior, faz mais uma brilhante análise do renascimento do velho Karl, em plena crise mundial de 2008, quando se comemorava os 150 anos do Manifesto. Veja a resposta à primeira pergunta ou acesse a íntegra em
www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=15253

“Há um indiscutível renascimento do interesse público por Marx no mundo capitalista, com exceção, provavelmente, dos novos membros da União Européia, do leste europeu. Este renascimento foi provavelmente acelerado pelo fato de que o 150° aniversário da publicação do Manifesto Comunista coincidiu com uma crise econômica internacional particularmente dramática em um período de uma ultra-rápida globalização do livre-mercado.
Marx previu a natureza da economia mundial no início do século XXI, com base na análise da “sociedade burguesa”, cento e cinqüenta anos antes. Não é surpreendente que os capitalistas inteligentes, especialmente no setor financeiro globalizado, fiquem impressionados com Marx, já que eles são necessariamente mais conscientes que outros sobre a natureza e as instabilidades da economia capitalista na qual eles operam.
A maioria da esquerda intelectual já não sabe o que fazer com Marx. Ela foi desmoralizada pelo colapso do projeto social-democrata na maioria dos estados do Atlântico Norte, nos anos 1980, e pela conversão massiva dos governos nacionais à ideologia do livre mercado, assim como pelo colapso dos sistemas políticos e econômicos que afirmavam ser inspirados por Marx e Lênin. Os assim chamados “novos movimentos sociais”, como o feminismo, tampouco tiveram uma conexão lógica com o anti-capitalismpo (ainda que, individualmente, muitos de seus membros possam estar alinhados com ele) ou questionaram a crença no progresso sem fim do controle humano sobre a natureza que tanto o capitalismo como o socialismo tradicional compartilharam. Ao mesmo tempo, o “proletariado”, dividido e diminuído, deixou de ser crível como agente histórico da transformação social preconizada por Marx.
Devemos levar em conta também que, desde 1968, os mais proeminentes movimentos radicais preferiram a ação direta não necessariamente baseada em muitas leituras e análises teóricas. Claro, isso não significa que Marx tenha deixado de ser considerado como um grande clássico e pensador, ainda que, por razões políticas, especialmente em países como França e Itália, que já tiveram poderosos Partidos Comunistas, tenha havido uma apaixonada ofensiva intelectual contra Marx e as análises marxistas, que provavelmente atingiu seu ápice nos anos oitenta e noventa. Há sinais agora de que a água retomará seu nível.



quarta-feira, 12 de outubro de 2011

O capitalismo chegou ao fim ? Parte 2.

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O professor Laurício Neumann, da Escola de Formação, Fé, Política e Trabalho, da Diocese de Caxias do Sul-RS, elaborou uma rica reflexão sobre a crise mundial, sob o titulo “Para entender a crise mundial do capitalismo”. Selecionei dois trechos: a) abertura, onde o professor fala da volta de Marx e Keynes; b) encerramento, onde registra que o neoliberalismo cometeu suicídio.

“A crise trouxe para o cenário várias questões de discussão como: a autoregulação do mercado; a utopia do livre mercado; o fim do neoliberalismo; a lógica especulativa do mercado desregulado; as lições de Keynes e Marx, para entender as cíclicas crises do capitalismo mundial; o capitalismo como sistema que se alimenta e sobrevive às custas das crises; e as perspectivas da construção de uma nova sociedade.
Enquanto a era do pensamento único dá sinais de esgotamento, Karl Marx (1818 – 1883) e John Maynard Keynes (1883 – 1964), que, até pouco tempo, eram alijados do debate econômico, hegemonizado pelo discurso do mercado livre, sem controle, quanto menos regulado melhor, voltam ao cenário da discussão para contribuir, com suas idéias, na compreensão da crise financeira americana, com suas repercussões mundiais.”
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“Em janeiro de 2009, os chefes de Estado das potências capitalistas, reunidos no Fórum Econômico de Davos, Suíça, admitiram que estavam enganados em relação a autoregulação do mercado e admitiram também a necessidade de reformular o capitalismo. Enquanto isso, no Fórum Social Mundial, no Brasil, também em janeiro de 2009, Boaventura de Sousa Santos, sociólogo e professor da Universidade de Coimbra, levantou o seguinte questionamento: “Se nós não dermos a solução, ela virá de Davos, com mais capitalismo e menos direitos. São eles que estão a pensar uma solução. Nós nos reunimos (no Fórum Social Mundial) desde 2001 e não fomos nós que derrotamos o neoliberalismo, ele cometeu suicídio. Eles estão lá (em Davos) pensando o que vai ser o capitalismo depois da crise. E nós, o que estamos fazendo?”.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

O capitalismo chegou ao fim ? Parte 1.

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O professor Laurício Neumann, da Escola de Formação, Fé, Política e Trabalho, da Diocese de Caxias do Sul-RS, elaborou uma rica reflexão sobre a crise mundial, sob o titulo “Para entender a crise mundial do capitalismo”. Selecionei alguns trechos do artigo.Pra começar, a opinião do Prof. Carlos Lessa.

“Carlos Lessa, economista e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), considerando os altos e baixos do cenário econômico norte-americano, que deixou o mundo em alerta, se pergunta: “Será que o capitalismo chegou ao fim?”. Ele responde: “Não”, pois o capitalismo tem “recursos para minimizar a crise”. Porém, com tanta turbulência, aponta Lessa, o capitalismo vai “negar a sua ideologia de livre mercado, porque sofrerá uma intervenção do Estado para superar essa crise”. Ainda não há como medir os estragos dessa tensão, mas uma coisa é certa: “O Brasil já foi atingido”, garante Lessa, que justifica: “A bolsa de valores caiu violentamente, o real se desvalorizou, a taxa de câmbio subiu, e as empresas brasileiras que têm empréstimos no exterior estão com muitas dificuldades de renová-los”. Segundo o economista, esses indicativos já estão comprometendo a economia brasileira de 2009, e, se medidas não forem tomadas, os brasileiros correm o risco de assistir a “uma bolha interna”. Quanto ao futuro, Lessa faz o seguinte prognóstico: “Duvido que seja possível manter o crescimento explosivo de vendas a crédito às famílias brasileiras. Elas se endividaram de maneira assustadora nos últimos dois anos, e agora, como vão segurar o pagamento de suas prestações com os juros subindo? O momento é cauteloso e o Brasil deve desenvolver políticas de controle de câmbio e de regulação das exportações”.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Classe dominante X consciência dominante. Parte 2


Em fevereiro de 1846, Marx e Engels são expulsos da França e refugiam-se em Bruxelas. No exílio, a dupla produz a “ideologia Alemã”, que não encontrou editor e foi entregue “à critica roedora dos ratos”, como disseram mais tarde os seus autores. Sua parte mais provocante talvez seja o capítulo 1º - as chamadas “Teses sobre Feuerbach”.  Na “Parte 1”, postei o texto referente à Revolução Francesa com a “transformação” de proletários em burgueses.  Nesta “Parte 2”, seguem – pra variar - os ácidos comentários dos autores ao idealismo de Hegel. A propósito, já fiz diversas postagens sobre essa relação Marx-Engels-Hegel – quanto mais leio, menos entendo. E a cada leitura, cresce meu incipiente “heguelianismo”......

“Uma vez separadas as ideias dominantes dos indivíduos dominantes, e sobretudo das relações decorrentes de uma dada fase do modo de produção, e atingido assim o resultado de que na história dominam sempre as ideias, é muito fácil abstrair destas várias ideias "a ideia", a Ideia, etc., como o que domina na história, e entender assim todas as diferentes ideias e conceitos como "autodeterminações" do conceito que se desenvolve na história. E, então, também é natural que todas as relações dos homens possam ser derivadas do conceito de Homem, do Homem tal como representado, da essência do Homem, do Homem. Foi o que fez a filosofia especulativa. O próprio Hegel confessa, no fim da Filosofia da História, que "apenas considerou o curso do conceito" e que na história apresentou a "verdadeira teodiceia" (p. 446). Podemos agora voltar aos produtores do "conceito", aos teóricos, ideólogos e filósofos, e chegamos então a esta conclusão: os filósofos, os pensadores como tais, desde sempre dominaram na história — uma conclusão que, como vemos, já foi expressa por Hegel. Todo o truque de demonstrar na história a soberania do espírito (a hierarquia, em Stirner) reduz-se, portanto, aos seguintes três esforços.
N.º 1. É preciso separar as ideias dos que dominam por razões empíricas, em condições empíricas e como indivíduos materiais, destes mesmos que dominam, e por esta via reconhecer o domínio das ideias ou ilusões na história.
N.º 2. É preciso pôr uma ordem neste domínio das ideias, demonstrar uma conexão mística entre as ideias que sucessivamente dominam, o que se consegue pela via de considerá-las "autodeterminações do conceito" (e isto é possível pelo fato de estas ideias, graças à sua base empírica, estarem realmente em conexão entre si, e pelo fato de elas, entendidas como meras ideias, se tornarem autodistinções, diferenças feitas pelo pensamento).
N.º 3. Para eliminar o aspecto místico deste "conceito que se autodetermina", transformam-no numa pessoa — "a Consciência de Si" —, ou, para parecerem verdadeiramente materialistas, numa série de pessoas que representam "o conceito" na história, nos "pensadores", nos "filósofos", nos ideólogos, que agora de novo são entendidos como os fabricantes da história, como o "Conselho dos Guardiães", como os dominantes. Deste modo eliminaram da história todos os elementos materialistas, e puderam então dar rédea solta ao seu corcel especulativo.
Este método histórico que dominou na Alemanha, e especialmente a razão por que dominou, têm de ser explicados a partir da conexão com a ilusão dos ideólogos em geral, por exemplo, as ilusões dos juristas, políticos (entre os quais, também, os estadistas práticos), a partir das divagações dogmáticas e distorções destes sujeitos, ilusão aquela que muito simplesmente se explica pela sua posição prática na vida, pela sua atividade e pela divisão do trabalho.”

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Classe dominante X consciência dominante. Parte 1


Em fevereiro de 1846, Marx e Engels são expulsos da França e refugiam-se em Bruxelas. No exílio, a dupla produz a “Ideologia Alemã”, que não encontrou editor e foi entregue “à critica roedora dos ratos”, como disseram mais tarde os seus autores. Sua parte mais provocante talvez seja o capítulo 1º - as chamadas “Teses sobre Feuerbach”. Selecionei, pra começar, um trecho sobre a revolução de 1789, quando a burguesia “derrubou o domínio da aristocracia” e a transformação de proletários em burgueses, algo muito semelhante ao ocorrido com a evolução da “ditadura do proletariado” de 1917.......

“Quando burguesia francesa derrubou o domínio da aristocracia, tornou desse modo possível a muitos proletários subirem acima do proletariado, mas apenas na medida em que se tornaram burgueses. Cada nova classe, por isso, instaura o seu domínio apenas sobre uma base mais ampla do que a da até aí dominante, pelo que, em contrapartida, mais tarde também o antagonismo da classe não dominante contra a agora dominante se desenvolve muito mais aguda e profundamente. Por ambas as razões é determinado o fato de que a luta a travar contra a nova classe dominante por seu turno visará uma negação mais radical, mais decidida, das condições sociais até aí vigentes do que fora possível a todas as classes que anteriormente procuraram dominar.”

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Marxólogo ou marxista ?


Um amigo jornalista, companheiro de Partidão dos tempos da UNE, costuma definir Delfim como “um marxista infiltrado”....
A cada terça-feira, quando leio a coluna da página 3 do Valor, fico na dúvida de como classificar o professor emérito da FEA-USP se marxista ou marxólogo.
Veja esse trecho do artigo de hoje  04/10/2011 e faça vc mesmo a sua classificação.

“A economia, se for alguma coisa , é uma ciência social. Tenta entender um universo mutante, onde todas as “constantes” são “variáveis” e, não importa qual a potencia da metodologia usada para torturar o passado para que ele revele o futuro, este continua opaco. Como não é possível construir experimentos críticos capazes de discriminar entre as duas visões, é claro que ambas envolvem larga dose de ideologia.”

domingo, 2 de outubro de 2011

Deslocamentos do Centro de Gravidade Mundial. Parte 2


Em fevereiro de 1850, Marx escreve artigo na Nova Gazeta Renana e faz profecias a partir da descoberta das minas de ouro na Califórnia. Nesta parte 2, a criatividade do velho Karl coloca um letreiro nas Muralhas da China que Irá recepcionar os reacionários europeus em fuga: “República Chinesa – Liberdade Igualdade e Fraternidade”..,,,

“Graças ao ouro californiano e à energia inesgotável dos yankees, os dois lados do Pacífico serão em breve tão povoados e tão ativos no comércio e na indústria como o é atualmente a costa de Boston a Nova Orleans. O oceano Pacífico desempenhará no futuro o mesmo papel que foi do Atlântico na nossa era e do Mediterrâneo na Antiguidade: o de grande via marítima do comércio mundial, e o oceano Atlântico descerá ao nível de um mar interior, como é hoje o caso do Mediterrâneo.
A única probabilidade que têm os países civilizados da Europa de não caírem na mesma dependência industrial, comercial e política da Itália, da Espanha e do Portugal modernos é iniciarem uma revolução social que, enquanto ainda é tempo, adaptarem a economia à distribuição segundo as exigências da produção e das capacidades produtivas modernas, e permitirem o desenvolvimento de novas forças de produção que assegurem a superioridade da indústria européia, compensando assim os inconvenientes da sua localização geográfica.
Enfim, uma curiosidade característica da China, contada pelo conhecido missionário alemão Gutzlaff. Uma excessiva população, de crescimento lento mas regular, tinha provocado, já desde há muito tempo, uma tensão violenta nas relações sociais da maior parte da nação. Em seguida vieram os ingleses, que forçaram a abertura de cinco portos ao livre comércio. Milhares de navios ingleses e americanos singraram para a China, que, em pouco temo, foi inundada de produtos britânicos e americanos baratos ( meu comentário: quem diria que 150 anos depois o fluxo se inverteria!!!). A indústria chinesa, essencialmente de manufaturas, sucumbiu à concorrência do maquinismo. O inabalável Império sofreu uma crise social. Os impostos deixaram de entrar, o Estado encontrou-se à beira da falência, a grande massa da população conheceu a completa pobreza, e revoltou-se. Acabando com a veneração aos mandarins do Imperador e aos bonzos, perseguia-os e matava-os. Hoje, o país está à beira do abismo, e talvez sob a ameaça de uma revolução violenta.
Mais ainda. No seio da plebe insurreta, alguns denunciavam a miséria de uns e a riqueza de outros, exigindo nova repartição dos bens, e mesmo a supressão total da propriedade privada - e ainda hoje continuam a formular tais reivindicações. Após vinte anos de ausência, quando o sr. Gutzlaff regressou ao contacto dos civilizados e dos europeus, e ouviu falar do socialismo, exclamou aterrorizado:"Não poderei então escapar em lado nenhum a esta perniciosa doutrina? É exatamente isso o que apregoam há algum tempo muitos indivíduos da população chinesa!"
É muito provável que o socialismo chinês se assemelhe ao europeu como a filosofia chinesa ao hegelianismo. Qualquer que seja a forma, podemos alegrar-nos com o fato de que o Império mais antigo e sólido do mundo tenha sido arrastado em oito anos, pelos fardos de algodão dos burgueses da Inglaterra, até a iminência de uma convulsão social que, qualquer que seja o caso, deve ter consequências importantíssimas para a civilização. E, quando os reacionários europeus, na sua já próxima fuga, chegarem enfim junto à Muralha da China, às portas que supõem abrir-se como fortaleza da reação e do conservadorismo, quem sabe se não lerão ali:
República Chinesa
Liberdade, Igualdade e Fraternidade
Íntegra do artigo em:
http://www.marxists.org/portugues/marx/1850/02/deslocamento.htm

sábado, 1 de outubro de 2011

Deslocamentos do Centro de Gravidade Mundial. Parte 1


Em fevereiro de 1850, Marx escreve artigo na Nova Gazeta Renana e faz profecias a partir da descoberta das minas de ouro na Califórnia. Neste primeiro trecho selecionado o autor afirma que os efeitos serão mais consideráveis que a própria descoberta da América. Na parte 2, que será postada a seguir, a criatividade do velho Karl coloca um letreiro nas Muralhas da China que Irá recepcionar os reacionários europeus em fuga: República  Chinesa – Liberdade Igualdade e Fraternidade.

“Vamos agora ocupar-nos da América, onde sucedeu algo mais importante do que a revolução de Fevereiro [1848]: a descoberta das minas de ouro californianas. Dezoito meses após o acontecimento já é possível prever que terá efeitos mais consideráveis do que a própria descoberta da América. Ao longo de três séculos todo o comércio da Europa em direção ao Pacífico contornou, com paciência admirável, o cabo da Boa-Esperança ou o cabo Horn. Todos os projetos de praticar uma abertura no istmo do Panamá falharam devido às rivalidades e invejas mesquinhas dos povos comerciantes. Dezoito meses após a descoberta das minas de ouro californianas, os yankees começaram já a construir uma estrada de ferro, uma grande estrada e um canal no Golfo do México. E já existe uma linha regular de barcos a vapor de Nova Iorque a Chagres, do Panamá a S. Francisco, concentrando-se no Panamá o comércio com o Pacífico e deixando de se utilizar a rota do cabo Horn. O vasto litoral da Califórnia, com 30 graus de latitude, um dos mais belos e mais férteis do mundo, por assim dizer desabitado, vai se transformando rapidamente num rico país civilizado, densamente povoado por homens de todas as raças, do yankee ao chinês, ao negro, ao índio e ao mulato, do crioulo e mestiço ao europeu. O ouro californiano corre abundante em direção à América e à costa asiática do Pacífico, e os povos bárbaros mais passivos são arrastados para o comércio mundial e para a civilização.
Uma segunda vez o comércio mundial muda de direção. O que eram, na Antiguidade, Tir, Cartago e Alexandria, na Idade Média, Gênova e Veneza, e, até agora, Londres e Liverpool, a saber, os empórios do comércio mundial, serão no futuro Nova Iorque e São Francisco, São João de Nicarágua e Leão, Chagres e Panamá. O centro de gravidade do mercado mundial era a Itália, na Idade Média, a Inglaterra na era moderna, e é hoje a parte meridional da península norte-americana.
A indústria e o comércio da velha Europa terão que fazer esforços terríveis para não caírem na decadência, como aconteceu com a indústria e o comércio da Itália no século XVI, isto se a Inglaterra e a França não quiserem tornar-se o que são hoje Veneza, Gênova e a Holanda. Daqui a alguns anos teremos uma linha regular de transporte marítimo a vapor da Inglaterra a Chagres, de Chagres e São Francisco a Sidney, Cantão e Cingapura.”