domingo, 20 de novembro de 2011

Marx poeta, criticado por ele mesmo.


Em 1º de agosto de 1946, a publicação quinzenal “Divulgação Marxista” – editada no Rio por Calvino Filho e S.O. Hersen – circula com um artigo que transcreve  carta de Marx onde ele faz uma autocrítica de seus poemas. Duas referências da carta – “Oulanem” e “Skorpion e Felix” – serão objetos de postagens na próxima semana. Por causa de “Oulanem”, fanáticos religiosos, ainda hoje, identificam o velho Karl como “parceiro do diabo”.

“ Em dezembro de 1836, três meses depois de sua entrada para a Universidade de Berlim, Marx abandonou em mãos de Jenny Von Westphalen, com quem secretamente noivara durante as férias de 1836 em Treves, três cadernos de poesias. No fim do semestre universitário (fevereiro-março de 1837), enche novo caderno de versos e manda-o para seu pai, em comemoração de seu 55º aniversário.
Algum tempo depois, Marx, com dezenove anos, julga severamente, numa carta escrita a seu pai em 10 de novembro de 1837, esses ensaios da mocidade, impregnados de um romantismo então na moda, contra o qual se levantará tão asperamente, mais tarde. Os três primeiros cadernos de poesia de Marx perderam-se. O Instituto Marx-Engels-Lenin conseguiu encontrar o caderno de 1837 que contém, além disso, parte dos poemas incluídos nos primeiros manuscritos.
No estado de espírito em que me encontrava, a poesia lírica devia, necessariamente, constituir o primeiro objeto do meu estudo, ou, pelo menos, o mais agradável e o mais indicado; minha situação e toda a minha anterior evolução faziam com que essa poesia fosse puramente idealista. Fiz, de um “mais além” tão distante quanto meu amor, todo o meu céu e a minha arte. Uma realidade que se esfuma e dissipa no infinito, acusações contra os tempos presentes, sentimentos vagos e confusos, uma ausência total de naturalidade, construções nas nuvens, uma oposição absoluta entre o ideal e a realidade, retórica e raciocínios em lugar de inspiração poética, entretanto, com certo calor de sentimentos e certo esforço para voos líricos: eis o que caracteriza todas as poesias dos três primeiros cadernos que Jenny de mim recebeu. A amplitude dessas aspirações vagas e sem limites, que se manifestam sob as formas mais variáveis, expandem-se nesses poemas, em lugar de neles se concentrar (1).
......No fim desse semestre, procurei novamente a dança das musas e a música dos sátiros, e, no último caderno que lhe mandei, o idealismo brilha através de um humor forçado (Skorpion e Felix) ou ainda através de um drama fantástico e imperfeito (Oulanem) até que enfim se transforma inteiramente e evolui para uma fórmula de arte para, a mais das vezes a propósito de assuntos sem inspiração e de ideias sem impulsos.
Esses últimos poemas são, entretanto, os únicos que me fizeram entrever de repente, como por meio de uma varinha mágica – ah! esse toque me transformou – o reinado da verdadeira poesia, como algum longínquo palácio feérico, e todas as minhas criações se desfizeram em pó. (2)
(1)  Marx opõe aqui Dickten a Breiten fazendo um jogo de palavras intraduzível.
(2)  As poesias de Marx, seu drama Oulanem e alguns capítulos de Skorpion e Felix, romances humorísticos, figuram no tomo I das Obras editadas pelo Instituto Marx-Engels-Lenin.”

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