domingo, 14 de agosto de 2011

Engels: Hegel versus "Hegelianos".


Agosto de 1859. Engels escreve artigo para o jornal “Das Volk” comentando a obra de Marx “Contribuição Para a Crítica da Economia Política”, publicada no início daquele ano. Conforme já postamos recentemente, a obra, que consumiu 15 anos de pesquisa, foi reescrita e incorporada ao 1º volume de “O Capital”.
A grande atração do texto é a parte dedicada a Hegel – “guru” da juventude de Marx e Engels e colocado de lado por ambos, na idade madura. Embora criticando o “idealismo” de Hegel ( em minha pobre opinião, sua virtude principal), reconhece sua contribuição e critica os “hegelianos”........Selecionei dois trechos que merecem uma reflexão. Uma “palinha” para induzir à leitura: “O que distinguia o modo de pensar de Hegel do de todos os outros filósofos era o enorme sentido histórico que lhe estava subjacente. Por abstrata e idealista que fosse a forma, o desenvolvimento do seu pensamento não deixava de ir sempre em paralelo com o desenvolvimento da história universal....”
“ Desde a morte de Hegel quase nenhuma tentativa foi feita para desenvolver uma ciência no seu próprio encadeamento interno. Da dialética do mestre, a escola hegeliana oficial tinha-se apropriado apenas da manipulação dos artifícios mais simples, que aplicava a toda e qualquer coisa e, frequentemente ainda, com uma ridícula falta de jeito. Todo o legado de Hegel  se limitava, para ela, a um puro chavão, com a ajuda do qual cada tema era construído de uma forma apropriada, e a um índice de palavras e de maneiras de dizer que não tinham qualquer outro fim do que estarem presentes no momento certo em que as ideias e os conhecimentos positivos faltassem. Aconteceu, assim, que, tal como um professor de Bona disse, estes hegelianos não percebiam nada de nada, mas podiam escrever sobre tudo. E certamente assim era. No entanto, estes senhores, apesar da sua suficiência, tinham, contudo, uma tal consciência da sua debilidade que se mantinham o mais possível afastados das grandes tarefas; a velha e antiquada ciência conservava o seu terreno, em virtude da sua superioridade em saber positivo; e só quando Feuerbach despediu o conceito especulativo é que a hegelianice se foi gradualmente apagando e pareceu que o império da velha metafísica com as suas categorias fixas tinha começado de novo na ciência.
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Havia, portanto, aqui uma outra questão para resolver, que não tinha nada a ver com a Economia Política em si. Como tratar da ciência? De um lado, encontrava-se a dialética de Hegel, na forma "especulativa", completamente abstrata, em que Hegel a tinha deixado; do outro lado, o método ordinário, essencialmente metafísico-wollfiano, agora novamente na moda, segundo o qual os economistas burgueses tinham escrito os seus grossos livros falhos de coerência. Este último tinha sido de tal modo teoricamente aniquilado por Kant e, sobretudo, por Hegel, que só a inércia e a falta de um outro método simples puderam tornar possível a sua persistência prática. Por outro lado, na sua forma presente, o método de Hegel era absolutamente inutilizável. Ele era essencialmente idealista, e aqui tratava-se de desenvolver uma visão do mundo que era mais materialista do que todas as anteriores. Ele partia do pensamento puro, e aqui devia partir-se dos fatos mais obstinados. Um método que, segundo o seu próprio testemunho, "de nada através de nada chegava a nada, não estava, nesta [sua] forma, de modo algum, no lugar [certo]. Apesar disso, de entre todo o material lógico atual, era o único fragmento a que ao menos se podia ligar. Não tinha sido criticado, não tinha sido superado; nenhum dos adversários do grande dialético tinha podido abrir uma brecha no seu glorioso edifício; tinha desaparecido, porque a escola de Hegel não tinha sabido agarrá-lo. Antes do mais, tratava-se, portanto, de submeter o método de Hegel a uma crítica eficaz.
O que distinguia o modo de pensar de Hegel do de todos os outros filósofos era o enorme sentido histórico que lhe estava subjacente. Por abstrata e idealista que fosse a forma, o desenvolvimento do seu pensamento não deixava de ir sempre em paralelo com o desenvolvimento da história universal, e esta última, propriamente, não deverá ser senão a prova do primeiro. Ainda que, por este fato, a relação correta tenha sido também invertida e posta de pernas para o ar, o seu conteúdo real penetrou, contudo, por todo o lado, na filosofia; tanto mais que Hegel se diferenciava dos seus discípulos em que não se gabava, como eles, da sua ignorância, mas era uma das cabeças mais sábias de todos os tempos. Foi ele o primeiro a procurar mostrar um desenvolvimento, um encadeamento interno, na história e, por estranha que agora muita coisa na sua filosofia da história nos possa parecer, a grandiosidade da própria visão fundamental é ainda hoje digna de admiração, quando se lhe comparam os seus predecessores ou mesmo aqueles que depois dele se permitiram reflexões universais sobre a história. Na Fenomenologia, na Estética, na História da Filosofia, por toda a parte perpassa esta grandiosa concepção da história e, por toda a parte, a matéria é tratada historicamente, numa conexão determinada, ainda que também abstratamente distorcida, com a história.

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