terça-feira, 31 de março de 2015

Marx e a entrevista ao The Chicago Tribune. 4/6


Em dezembro de 1878, aos 60 anos, Marx concede longa entrevista ao correspondente do The Chicago Tribune. Destaque para a opinião do entrevistado sobre políticos.
“Marx - Do ponto de vista socialista, os meios para transformar revolucionariamente a fase histórica presente já existem. Em numerosos países, organizações políticas tomaram impulso a partir dos sindicatos. Na América, é evidente, hoje, a necessidade de um partido operário independente. Os trabalhadores não podem mais confiar nos políticos. Os especuladores e as "panelinhas" se apoderaram dos órgãos legislativos e a política tornou-se uma profissão. Não é somente o caso da América, mas ai o povo é mais resoluto do que na Europa; as coisas amadurecem mais rápido; não se fazem rodeios e se vai direto aos fatos.”

segunda-feira, 30 de março de 2015

Marx e a entrevista ao The Chicago Tribune. 3/6


Em dezembro de 1878, aos 60 anos, Marx concede longa entrevista ao correspondente do The Chicago Tribune. Selecionei alguns trechos que serão postados sequencialmente.
“Tribune - O que o socialismo conseguiu até hoje?
Marx - Duas coisas: os socialistas demonstraram que, em toda parte, uma luta geral opõe o Capital ao Trabalho, em suma, demonstraram seu caráter cosmopolita. Em consequência, procuraram efetivar um acordo entre os trabalhadores de diversos países. Este acordo é tanto mais necessário visto que os capitalistas se tornam cada vez mais cosmopolitas. Não é somente na América, mas também na Inglaterra, França e Alemanha, que trabalhadores estrangeiros são empregados para serem utilizados contra os trabalhadores do próprio país. Criaram-se, imediatamente, vínculos internacionais entre os trabalhadores de diversos países. Eis o que provou que o socialismo não era unicamente um problema local, mas, antes, um problema internacional, que deve ser resolvido pela ação igualmente internacional dos trabalhadores. A classe operária põe-se espontaneamente em movimento, sem saber para onde o movimento a conduzirá. Os socialistas não criaram o movimento, mas explicaram aos operários seu caráter e seus objetivos.”

domingo, 29 de março de 2015

Marx e a entrevista ao The Chicago Tribune. 2/6


Em dezembro de 1878, aos 60 anos ( segundo o repórter – veja a seguir – aparentava mais de 70), Marx concede longa entrevista ao correspondente do The Chicago Tribune. Selecionei alguns trechos que serão postados sequencialmente.
Encontrei-me duas ou três vezes com o Dr. Marx, que me recebeu em sua biblioteca, sempre com um livro numa mão e um cigarro na outra. Ele deve ter mais de setenta anos. E um homem solidamente constituído, de ombros largos e porte ereto. Tem a fronte do intelectual e os modos do judeu culto; sua cabeleira e sua barba são longas e grisalhas; sobrancelhas espessas sombreiam seus olhos negros e brilhantes. Nada inclinado a circunspecção, reserva aos estrangeiros em geral a melhor acolhida” ............................................................................................
Para minha grande surpresa, nossos colóquios me revelaram que Marx conhecia fundo os problemas americanos dos últimos vinte anos. A singular justeza das críticas que dirigia ao nosso sistema legislativo, tanto o da União quanto o dos Estados, me deu a impressão de que possuía dados de fontes bem informadas. Contudo, esse saber não se limita a América, mas engloba, igualmente, toda Europa.
Quando chega ao seu tema predileto, o socialismo, não se lança a tiradas melodramáticas que lhe são geralmente atribuídas. Atém-se a seus planos utópicos de "emancipação do gênero humano" com uma gravidade e uma energia que demonstram que está convencido de que suas teorias se realizarão um dia, no próximo, se não for neste século.”

Marx e a entrevista ao The Chicago Tribune. 1/6


Em dezembro de 1878, aos 60 anos, Marx concede longa entrevista ao correspondente do The Chicago Tribune. Selecionei alguns trechos que serão postados sequencialmente.
“Karl Marx, fundador do socialismo moderno, mora numa pequena casa em Haverstock Hill, bairro do noroeste de Londres. Banido em 1844 de sua pátria, a Alemanha, por ter propagado teorias revolucionárias, vive desde então no exílio. Retornou ao seu país em 1848, mas foi expulso dois meses depois de seu retorno. Marx estabeleceu-se, em seguida, em Paris, onde, já no ano seguinte, suas ideias políticas lhe valeram uma nova expulsão. Desde então, fez de Londres o seu quartel-general. Suas convicções não cessaram, desde o primeiro dia, de lhe criar dificuldades e, a julgar pelo aspecto de sua casa; elas não Ihe proporcionaram grande conforto. Durante todo esse tempo, Marx pregou suas convicções com uma obstinação, indubitavelmente fundada na certeza que tem da justeza delas. Por mais que se possa ser contrário à difusão dessas ideias, é preciso admitir que a abnegação deste homem, atualmente em idade venerável, merece uma certa apreciação.

sábado, 28 de março de 2015

O papel do Estado na crise mundial.

Denis Collin afirma, em seu blog, que a crise financeira mundial confirma, de maneira clara, as análises do velho Karl. Segue minha tradução livre.
“A crise financeira de 2007/2008 e suas consequências confirmam de maneira clara as análises de Marx : o modo de  produção capitalista somente pode funcionar reproduzindo o capital sempre em uma escala  ampliada. Ou a busca de um processo de acumulação exige o recurso crescente ao credito e a todas as formas de investimento financeiro que permitam a distribuição, não de lucros reais, gerados no processo de produção, mas de ganhos antecipados, isto é, que não correspondam a um capital produtivo gerado pela mais valia.
É o que Marx chama de “capital fictício”. A massa do capital fictício terminou por incorporar o capital realmente investido, que é, ele mesmo, confrontado aos problemas crescentes de ajuste de valor, que Marx denominava de baixa tendencial  da taxa de lucro.
O exemplo da industria automobilística é particularmente esclarecedor para compreender, ao mesmo tempo, esta baixa das taxas de lucro e o peso crescente dos “produtos financeiros”.
Nesta situação e em uma escala gigantesca, encontramos ainda as análises de Marx sobre o papel da dívida pública na formação deste capital fictício. Que o Estado seja reduzido a “conselho de administração dos negócios comuns da burguesia” é certamente, desta maneira geral, uma concepção muito redutora. Durante as “trente glorieuses” ( obs. do tradutor: Período de grande crescimento de 1945 a 1973, nos países membros da OCDE, tb conhecido, na França, como a Revolução Invisível) o Estado foi o lugar da aposta nas lutas sociais para assegurar um desenvolvimento próximo da estabilidade do modo de produção capitalista, e  ele teve que proteger e , por vezes, organizar as conquistas sociais correspondentes às reivindicações dos assalariados.
Mas o se que chamou usando a expressão inadequada de “revolução neo-liberal” foi uma vasta operação política remetendo o Estado à sua clássica definição marxista.

A percepção da falência do sistema financeiro e sua consequência nos custos para os cidadãos acabou por reposicionar os governos como simples apoios de poder do capital financeiro.”

terça-feira, 24 de março de 2015

O hegeliano Karl Marx


Uma parcela ponderável dos estudiosos da obra de Marx insiste em identificar dois “Marxs” : o hegeliano da juventude e o da maturidade, que teria “abandonado” a filosofia de seu inspirador. Seguem dois trechos do primeiro fascículo de “Para a Crítica da Economia Política”, de 1859, com o filósofo de Trier no auge de seus 41 anos. A conclusão fica por conta dos leitores.....
“O que distinguia o modo de pensar de Hegel de todos os outros filósofos era o enorme sentido histórico que lhe estava subjacente. Por abstrata e idealista que fosse a forma, o desenvolvimento do seu pensamento não deixava de ir sempre em paralelo com o desenvolvimento da história universal, e esta última, propriamente, não deverá ser senão a prova do primeiro.”
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“Foi ele o primeiro a procurar mostrar um desenvolvimento, um encadeamento interno, na história e, por estranha que agora muita coisa na sua filosofia da história nos possa parecer, a grandiosidade da própria visão fundamental é ainda hoje digna de admiração, quando se lhe comparam os seus predecessores ou mesmo aqueles que depois dele se permitiram reflexões universais sobre a história. Na Fenomenologia, na Estética, na História da Filosofia, por toda a parte perpassa esta grandiosa concepção da história e, por toda a parte, a matéria é tratada historicamente, numa conexão determinada, ainda que também abstratamente distorcida, com a história.”

domingo, 22 de março de 2015

A prisão de Jenny, em Bruxelas.


Em março de 1848, Marx é preso e Jenny tenta mobilizar os membros da Associação Democrática de Bruxelas – onde o marido era vice-presidente. O democrata Gigot acompanha Jenny até a delegacia e é  trancafiado em uma cela. Marx relata o incidente em carta ao editor do La Reforme. Segue um trecho que registra a violência :
“Minha esposa, sob a acusação de “vagabundagem”, foi levada para a prisão no Hôtel de Ville e trancada em uma sala escura com prostitutas. Às 11 horas da manhã, ela foi levada, sob escolta policial e à luz do dia, para o escritório do magistrado responsável. Por duas horas, ela foi mantida sob forte custódia, apesar dos mais vigorosos protestos emitidos por todos os lados. Ela foi mantida lá, no frio congelante, exposta aos comentários mais vergonhosos feitos pelos policiais.
Finalmente ela apareceu perante o magistrado responsável, que estava surpreso porque a polícia, em sua solicitude, não prendeu ao mesmo tempo as crianças. O interrogatório foi, naturalmente, uma fraude, e o único crime de minha esposa consiste no fato de que, apesar de pertencer à aristocracia prussiana, ela possui as mesmas opiniões democráticas de seu marido.

sábado, 14 de março de 2015

Marx, negação e defesa.


O parágrafo inicial de “Dr. Marx e os críticos vitorianos” ( Hobsbawm) estimula uma postura construtiva na visão da obra marxiana , na perspectiva da segunda década do século 21. É preciso abandonar a refutação e a defesa e, como afirma o próprio Hobsbawm, “ refletir sobre a questão de qual será o futuro do marxismo e da humanidade neste século”. Um comportamento que tem orientado os Encontros internacionais realizados pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pela Universidade Nova de Lisboa (UNL). Em outubro de 2013, participei de mesa do evento da UNL apresentando o Fetichismo da Mercadoria ( presente no capítulo 1 de O Capital – 1867) como o conceito precursor do marketing.
Segue o texto do guru de todos nós, Eric Hobsbawm:
“Desde o surgimento do marxismo como força intelectual, dificilmente haverá passado um ano – e no mundo anglo-saxão, a partir de 1945, uma semana – sem que houvesse alguma tentativa de refutá-lo. Os textos de refutação e defesa daí resultantes têm se tornado cada vez mais enfadonhos, porque cada vez mais repetitivos.”

terça-feira, 10 de março de 2015

A diabólica invenção do sufrágio universal.



Mais uma vez, Delfim Netto, faz um registro criativo sobre o sufrágio universal. Segue trecho de sua coluna semanal no Valor Econômico, hoje, 10 de março de 2015. Antes da leitura, vale uma rápida definição de “assintoticamente” ou “assimptoticamente”:  se refere a uma aproximação até a infinidade, sem no entanto atingir determinado limite. Bem Delfim!!
“Depois de uma seleção quase natural, que dura pelo menos há 150 mil anos, os homens não encontraram, ainda, uma organização social que maximize, ao mesmo tempo, a liberdade individual, a igualdade e a eficiência produtiva que lhes permitiria gozarem plenamente as duas primeiras.
Desde o começo do século XVIII, ficou claro que elas só poderiam ser acessadas assintoticamente. Tratava-se de um jogo entre a eficiência da organização da economia pelos “mercados” ( que ignoram a igualdade e aceitam a liberdade) e a diabólica invenção do sufrágio universal (a “urna”), gestada pela pressão da organização dos trabalhadores, que insiste na igualdade, mesmo a custa de alguma redução no aumento da eficiência.”

sábado, 7 de março de 2015

Os objetivos do socialismo.


Em entrevista ao Chicago Tribune em 18 dezembro de 1878, Marx relacionou os objetivos do socialismo, conforme definido no Congresso Socialista de Gotha  (maio de 1875). Destaque para o item a – Sufrágio Universal.
a) Sufrágio universal, igual, direto, secreto e obrigatório para todos os cidadãos maiores de vinte anos e para todas as eleições gerais e comunais. O dia da eleição será um domingo ou um dia feriado;
b) Legislação popular direta. guerra e a paz decididas pelo povo;
c)  Nação Armada. Substitui ao do exército permanente pela milícia popular;
d) Supressão das leis de exceção, notadamente as leis sobre a imprensa, reuniões e associações; em geral, todas leis;
e) Instituição de tribunais populares. Gratuidade da justiça;
f)  Educação geral e igual do povo pelo Estado. Obrigação escolar. Instrução gratuita em todos os estabelecimentos escolares;
g) Máxima extensão possível dos direitos e liberdade, no sentido das reivindicações acima citadas;
h) Imposto único e progressivo sobre a renda, para o Estado e as comunas, em lugar de todos os impostos indiretos, especialmente daqueles que sobrecarregam o povo;
i)  Direito ilimitado de associação;
j)  Jornada de trabalho correspondente as necessidades sociais. Proibição do trabalho aos domingos;
k) Interdição do trabalho das crianças, bem como do trabalho cuja natureza prejudique a saúde e seja ofensivo à moral da mulher;
l)  Leis de proteção a vida e a saúde dos trabalhadores. Controle sanitário dos alojamentos operários. Fiscalização do trabalho nas usinas, fábricas e oficinas, bem como trabalho a domicílio, por funcionários eleitos pelos trabalhadores. Lei delimitando claramente as responsabilidades;
m)    Regulamentação do trabalho nas prisões.


terça-feira, 3 de março de 2015

O mais poderoso civilizador dos mercados.


Em 6 de março de 1895, 5 meses antes de sua morte (5/8/1895), Engels produz um de seus mais amadurecidos ensaios, ao fazer a introdução de mais uma edição alemã da “A Luta de Classes na França”. O texto, tb conhecido como o “testamento de Engels”, faz a defesa do sufrágio universal. Alguns trechos:
“O modo de luta de 1848 está hoje ultrapassado em todos os aspectos.” “Com esta utilização vitoriosa do sufrágio universal entrara em ação um modo de luta totalmente novo do proletariado, modo de luta esse que rapidamente se desenvolveu.” ”A ironia da história universal põe tudo de cabeça para baixo. Nós, os "revolucionários", os "subversivos", prosperamos muito melhor com os meios legais do que com os ilegais e a subversão.”
Nesta 2ª década do século 21, Delfim Netto é defensor permanente so sufrágio universal em sua coluna semanal no Valor Econômico. Vide coluna de hoje – 3/03/15 – ao reafirmar que o capitalismo precisa de adversários fortes: “ O grande adversário foi criado pela organização política do trabalho que recusou sua completa mercadização e inventou o sufrágio universal, o mais poderoso instrumento civilizador dos mercados”.