terça-feira, 23 de abril de 2013

O fetichismo do plano


Segue a última parte da tradução livre dos comentários de Guillaume Collinet sobre o livro “Le fétichisme chez Marx, le marxisme comme théorie critique” de Antoine Artous . Nesta postagem, Collinet se pergunta o que seria de uma sociedade sem qualquer fetiche?  E admite que “os erros cometidos pelos países do "socialismo real" veio para preencher as lacunas internas na teoria de Marx, lançando sobre elas um forte facho de luz”.

“O mais interessante é o capítulo final do livro de Artous, que examina a delicada questão da natureza do socialismo, as implicações da necessária expansão da teoria do fetichismo além daquela que se circunscreve meramente à mercadoria. O que seria uma sociedade sem qualquer fetiche? Sabemos que Marx responde a esta pergunta com a ideia de "plano comum/consertado/harmonizado (conserté) ". Em uma sociedade onde, baseada na propriedade comum dos meios de produção, a atividade econômica assume uma forma planificada e as relações sociais tornam-se simples e transparentes.
Com tal resposta, Marx se apresenta curiosamente infiel à sua própria intuição de um fetichismo próprio da forma organizada. Como testemunho, destaque-se a comparação que ele mesmo estabelece entre a abordagem de Robinson Crusoé, anotando em um livro o trabalho já realizado e os restantes para ser feito, e a lógica prevalecente na futura sociedade comunista.
O planejamento, mesmo o “concertado”, como o realizado dentro da empresa capitalista, corresponde a uma forma social, que cristaliza o trabalho social realizado pela cooperação entre os vários produtores. Em outras palavras, a operação consiste em, depois de um plano,  transformar uma multidão de forças de trabalho individuais em uma única força de trabalho social  não pode ser reduzida a uma "administração de coisas",  a uma simples operação de tecnologia  social.

Falta a Marx, a despeito de suas intuições, uma análise do “plano” como uma relação social de produção. Isso vale também para o marxismo ulterior. Trotsky, por exemplo, cujo mérito é se aperceber que, com base nas contradições de uma economia estatizada e planificada, pode se construir uma burocracia, no entanto se recusou  ao menos a considerar que esta classe social pudesse intervir no processo de produção (ele circunscreveu sua ação ao segmento da distribuição). Será que é preciso dizer que a falta de uma caracterização do “plano” como provável formador de  uma classe pesou muito no destino dos regimes ditos marxistas?
Não é, no entanto, intenção de Artous, fazer de Marx  o responsável por esse destino, mas apenas a admitir que os erros cometidos pelos países do "socialismo real" veio para preencher as lacunas internas na teoria de Marx, lançando sobre elas um forte facho de luz.
Ao final, a leitura da obra de Artous deixa a todos convencidos do imenso painel   teórico aberto a todos aqueles para os quais a crítica das relações sociais capitalistas ainda tem como se alimentar na obra Marx.
Que status deve ser dado aos pressupostos jurídicos e políticos contidos nos relatórios e comerciais e organizacionais? Qual é a relação entre o capitalismo, mercado e organização ? Como pensar, em uma sociedade socialista, a articulação entre as formas de mercado, organizadas e de produção associativa? Como se vê, não é possível se contentar com simples ajustes à teoria de Marx  ou até mesmo correções marginais. A tarefa com a qual os marxistas contemporâneos estão confrontados é a reconstrução do marxismo.
Ao identificar a possibilidade de um fetichismo da organização, estabelecendo que o capitalismo se define também pelo desenvolvimento de formas específicas de administração (e não apenas pelo mercado), sublinhando que o socialismo não pode ser identificado pelo formato de organização da produção, sem dúvida, o trabalho de Artous aporta uma contribuição muito útil para esta tarefa.”
Referência:
Guillaume Collinet, "Antoine Artous, o fetichismo de Marx marxismo como teoria crítica,"| 2006 posted 27 de dezembro de 2012, http://variations.revues.org/525







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