Nicolas Lichtmaier, em “El fetichismo de La mercancia” (
Teorias Sociológicas Del Estado) faz uma interessante análise do tema a partir
da afirmativa “Este mundo "fetichizado" do capitalismo é um processo
que transforma o qualitativo em quantitativo, iguala tudo e compara tudo”. Selecionei um pequeno trecho e fiz uma tradução livre.
Quem tiver interesse em conhecer a íntegra, acesse www.lichtmaier.com.ar
“ Marx utilizou o conceito de fetichismo da mercadoria para descrever um "feitiço” (“embrujo”)
que envolve os bens produzidos no âmbito do sistema de produção capitalista. Os
produtores produzem, privadamente, bens e, em seguida, se vinculam com outros
seres humanos através desses bens. De acordo com o fetichismo das mercadorias, os
bens se apresentam ao um produtor como uma coisa, e seu valor é pré-existente. É anterior e
determinante do produtor e de seu processo de produção. O produtor torna-se
então um atributo do objeto produzido, e este último é torna-se sujeito. E este
objeto ao se tornar "sujeito" é o que constrói relacionamentos
"humanos" com outros objetos a serem trocados no mercado. Este mundo
"fetichizado" do capitalismo é um processo que transforma o
qualitativo em quantitativo, iguala tudo e compara tudo.
Não se pode despertar do fetichismo da mercadoria, ao
contrário do que acontece com o ideologia. As formas de pensar marcadas por
este efeito não são uma fraude. Marx observa que são objetivas, socialmente
válidas, e que caracterizam o modo de produção. Esta operação de transferência,
de comparação do trabalhos humanos homogeneizados sob a forma de mercadoria,
não exige que os atores participem de dela de maneira consciente.
Žižek explica como esta operação ocorre fora da consciência,
mostrando um paralelo entre o fetichismo da mercadoria e funcionamento do
inconsciente descrito por Freud e Lacan. Ele observa que a distinção
diferenciação que Marx faz entre forma e conteúdo - sendo a forma a chave para
a compreender o mecanismo - pode ser comparado com a descrição de Freud do
processo pelo qual são criados sonhos. Neste processo, um pensamento latente
(que não é misterioso, e até pode ser consciente) é "arrastado" para
o inconsciente. Ali, submerge nos processos primários do inconsciente por onde
nos chega a linguagem. Estes processos lhe dão forma e, finalmente, emerge no
conteúdo manifesto do sonho.
Nesta tríade, nem o conteúdo do sonho nem o pensamento
latente são o que interessa.
O interessante é por que esse pensamento latente adotou essa
forma determinada, porque aí aparece a marca deixada por estes processos
primários do inconsciente? Os economistas liberais clássicos – com os quais
Marx dialoga em O Capital – tentam desvendar o segredo através do que seria o "pensamento latente" da
economia: o valor. Esses economistas tentam descobrir a origem dele,
desenvolvendo vários conceitos e teorias com esse objetivo. Eles haviam
descoberto que existia uma relação entre o valor e o trabalho contido nas mercadorias,
mas ainda não conseguiam desvendar o mistério, por exemplo, da origem do lucro
capitalista. Marx diz que eles chegam a um valor que é para eles um hieróglifo,
um significante arbitrário que não pode conseguem interpretar.
Marx assinala que isso sucede porque o mistério a revelar não
é o segredo da origem do valor, mas a forma que ele assume. Tal como no caso do
inconsciente, há um núcleo duro, o desejo, e no caso da mercadoria, o núcleo
oculto são as relações de dominação. Em um fóssil não importa tanto analisar a
matéria calcária de que é feito, mas a forma como foi moldado por um ser que
não está mais no fóssil. Da mesma forma, a análise de como é gerado o valor do trabalho humano,
não revela o segredo do sistema. Esse segredo aparece na forma em que adota
esse valor, e porque nessa forma e não em outras. Os economistas clássicos dão
por encerrado e interrompem sua análise no que para eles é um hieróglifo.
Economistas liberais cristalizaram esses pressupostos, deshistorializando-os,
ao assumir uma determinada natureza humana. Para exemplificar, utilizaram-se de
Robinson Crusoé. O operação que fizeram foi transplantar para sua ilha
conceitos, que, na verdade, pertencem às relações sociais. Para os economistas
liberais – ainda hoje - se Robinson Crusoé prepara uma vara para colher frutas
com facilidade, ele está gerando
capital. Marx observou, no
entanto, que para Robinson Crusoé não existe o capital enquanto tal. Para ele
tudo é maior ou menor quantidade de trabalho. E para ele, os produtos de seu
trabalho são valores de uso.”
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