quarta-feira, 9 de maio de 2012

O processo dos sonhos e o fetichismo da mercadoria

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Nicolas Lichtmaier, em “El fetichismo de La mercancia” ( Teorias Sociológicas Del Estado) faz uma interessante análise do tema a partir da afirmativa “Este mundo "fetichizado" do capitalismo é um processo que transforma o qualitativo em quantitativo, iguala  tudo e compara  tudo”. Selecionei um pequeno trecho e fiz uma tradução livre. Quem tiver interesse em conhecer a íntegra, acesse    www.lichtmaier.com.ar
“ Marx utilizou o conceito de fetichismo da mercadoria para descrever um "feitiço” (“embrujo”) que envolve os bens produzidos no âmbito do sistema de produção capitalista. Os produtores produzem, privadamente, bens e, em seguida, se vinculam com outros seres humanos através desses bens. De acordo com o fetichismo das mercadorias, os bens se apresentam ao um produtor como uma coisa, e seu  valor é pré-existente. É anterior e determinante do produtor e de seu processo de produção. O produtor torna-se então um atributo do objeto produzido, e este último é torna-se sujeito. E este objeto ao se tornar "sujeito" é o que constrói relacionamentos "humanos" com outros objetos a serem trocados no mercado. Este mundo "fetichizado" do capitalismo é um processo que transforma o qualitativo em quantitativo, iguala  tudo e compara  tudo.
Não se pode despertar do fetichismo da mercadoria, ao contrário do que acontece com o ideologia. As formas de pensar marcadas por este efeito não são uma fraude. Marx observa que são objetivas, socialmente válidas, e que caracterizam o modo de produção. Esta operação de transferência, de comparação do trabalhos humanos homogeneizados sob a forma de mercadoria, não exige que os atores participem de dela de maneira consciente.
Žižek explica como esta operação ocorre fora da consciência, mostrando um paralelo entre o fetichismo da mercadoria e funcionamento do inconsciente descrito por Freud e Lacan. Ele observa que a distinção diferenciação que Marx faz entre forma e conteúdo - sendo a forma a chave para a compreender o mecanismo - pode ser comparado com a descrição de Freud do processo pelo qual são criados sonhos. Neste processo, um pensamento latente (que não é misterioso, e até pode ser consciente) é "arrastado" para o inconsciente. Ali, submerge nos processos primários do inconsciente por onde nos chega a linguagem. Estes processos lhe dão forma e, finalmente, emerge no conteúdo manifesto do sonho.
Nesta tríade, nem o conteúdo do sonho nem o pensamento latente são o que interessa.
O interessante é por que esse pensamento latente adotou essa forma determinada, porque aí aparece a marca deixada por estes processos primários do inconsciente? Os economistas liberais clássicos – com os quais Marx dialoga em O Capital – tentam desvendar o segredo através do que seria  o "pensamento latente" da economia: o valor. Esses economistas tentam descobrir a origem dele, desenvolvendo vários conceitos e teorias com esse objetivo. Eles haviam descoberto que existia uma relação entre o valor e o trabalho contido nas mercadorias, mas ainda não conseguiam desvendar o mistério, por exemplo, da origem do lucro capitalista. Marx diz que eles chegam a um valor que é para eles um hieróglifo, um significante arbitrário que não pode conseguem interpretar.

Marx assinala que isso sucede porque o mistério a revelar não é o segredo da origem do valor, mas a forma que ele assume. Tal como no caso do inconsciente, há um núcleo duro, o desejo, e no caso da mercadoria, o núcleo oculto são as relações de dominação. Em um fóssil não importa tanto analisar a matéria calcária de que é feito, mas a forma como foi moldado por um ser que não está mais no fóssil. Da mesma forma, a análise de como  é gerado o valor do trabalho humano, não revela o segredo do sistema. Esse segredo aparece na forma em que adota esse valor, e porque nessa forma e não em outras. Os economistas clássicos dão por encerrado e interrompem sua análise no que para eles é um hieróglifo.

Economistas liberais cristalizaram esses pressupostos, deshistorializando-os, ao assumir uma determinada natureza humana. Para exemplificar, utilizaram-se de Robinson Crusoé. O operação que fizeram foi transplantar para sua ilha conceitos, que, na verdade, pertencem às relações sociais. Para os economistas liberais – ainda hoje - se Robinson Crusoé prepara uma vara para colher frutas com facilidade, ele está  gerando capital.  Marx observou, no entanto, que para Robinson Crusoé não existe o capital enquanto tal. Para ele tudo é maior ou menor quantidade de trabalho. E para ele, os produtos de seu trabalho são valores de uso.”

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