Imagine duas bolsas femininas exatamente iguais – mesmas matérias
primas, mesmo design, mesmo acabamento. Apenas uma pequena diferença: uma delas
tem o DG, de Dolce e Gabana. A que porta o DG custa 10 vezes mais...... Na
metade do século 19, o velho Karl antecipou a situação ao identificar o
fetichismo das mercadorias. Ou como enfatiza Isaak Rabin, Marx vislumbrou “relações
humanas por trás das relações entre as coisas, revelando a ilusão da
consciência humana que se origina da economia mercantil”. Em meados do século
20, a fetichismo das mercadorias ganhou um apelido: Marketing.
Selecionei um trecho do excelente estudo de Felipe Augusto da Rocha
Santos – “O fetichismo da mercadoria - um passeio entre Marx e
a ''coisificação'' do trabalho humano” – que estimula uma reflexão.
“Tendo em vista a força da alienação, muitas
pessoas passam a ver as mercadorias com vidas próprias, envoltas em um caráter
místico. Os valores passam a fazer parte de uma suposta propriedade natural das
coisas. Isso é o que Karl Marx chamou de caráter fetichista da mercadoria. A
correlação íntima entre alguns dos conceitos presentes no marxismo, como a
mais-valia, a alienação e a ideologia, é fundamental para uma melhor
compreensão do fetichismo da mercadoria, por isso, esses conceitos são
convenientemente abordados no presente trabalho.
Mas, em linhas gerais, o que Marx representou na
concepção de fetichismo? Nas palavras de Isaak Rubin (1980, p.19),
Consiste em Marx ter visto relações humanas por
trás das relações entre as coisas, revelando a ilusão da consciência humana que
se origina da economia mercantil e atribui às coisas características que têm
sua origem nas relações sociais entre as pessoas no processo de produção.
O que Marx enxergou brilhantemente, em "O
Capital", foi o dispêndio de nervos, músculos e sentidos; o trabalho,
essencialmente humano, converter-se em valor objetivo da mercadoria. O enigma
do fetichismo dessa mercadoria se demonstra no momento em que, nas relações
entre produtores, as mercadorias refletem as características sociais do
trabalho como naturalmente intrínsecas às coisas. Por outro lado, "reflete
a relação social dos produtores com o trabalho total como uma relação social
existente fora deles, entre objetos" (MARX, 1996, p. 198). Coisificam-se
as relações humanas e personificam-se as coisas.
Conceituar de forma plena o fetichismo que envolve
a mercadoria é tarefa, de fato, complicada, obstaculizada pela própria forma
como o conceito vai evoluindo ao longo da obra "O Capital". No
entanto, serão aqui apresentadas mais algumas abordagens e a forma como a
ideologia do capital reforça a sua propagação.
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O fetichismo, portanto, apresenta-se também de
forma muito real, paradoxalmente, numa realidade muito concreta ante o
misticismo que envolve a conceituação da face fetichista da mercadoria. Ainda
em consonância com Rubin (1980, p. 73), ele não é só um fenômeno da consciência
social, mas um fenômeno da própria existência social. Percebe-se que a
sociedade adere ao fetichismo a partir do momento em que se resigna perante o
estabelecido, que se distancia de sua organização e produção. Ela passa a se
relacionar tão somente por meio de coisas que carregam em si essencialmente
trabalho. Ainda que o pensamento se subverta e passe a ver a mercadoria pelo
real trabalho que nela está inserido, o indivíduo permanecerá se relacionando
por meio da mercadoria, ressuscitando o fetiche. Não se trata, pois, de mera
questão de consciência individual, a questão passa pelas características do
modo de produção burguês. O que fica claro, conforme aduz Marx (1996, p.201), é
que "Todo o misticismo [...] das mercadorias, toda a magia e a fantasmagoria
que enevoam os produtos de trabalho [...] desaparecem, por isso, imediatamente,
tão logo nos refugiemos em outras formas de produção".