terça-feira, 30 de julho de 2013

O Marx do "pé-de-página". Parte 1


Tenho me dedicado, nos últimos dias, à leitura das notas de pé de página do Capital. Nas  próximas postagens vou selecionar algumas muito curiosas da seção 4 – O Fetichismo das Mercadorias e seu Segredo – do Capítulo I.
Neste primeiro ensaio, destaco a critica de Marx a  Adam Smith e Ricardo que tratam a forma-valor como qualquer coisa de indiferente ou sem qualquer relação intima com a natureza da própria mercadoria”. O detalhe é revelador do todo: o fetichismo da mercadoria é a diferenciação básica de Marx/Engels dos economistas clássicos ingleses – a forma-valor tem relação íntima com a natureza da mercadoria.
Primeiro o texto e, a seguir, a nota de pé de página:
O texto:
“É certo que a economia política, embora de uma forma muito imperfeita, analisou o valor e a grandeza do valor [e descobriu o conteúdo escondido nessas formas]. Mas nunca pôs a questão de saber [porque é que esse conteúdo reveste essa forma,] por que é que o trabalho se representa no valor, e a medida do trabalho pela sua duração na grandeza do valor dos produtos.(vide nota)
A Nota:
“Uma das falhas principais da economia política clássica é nunca ter conseguido deduzir da sua análise da mercadoria, e especialmente do valor dessa mercadoria, a forma[-valor] sob a qual ela se torna valor-de-troca. São precisamente os seus melhores representantes, tais como Adam Smith e Ricardo que tratam a forma-valor como qualquer coisa de indiferente ou sem qualquer relação intima com a natureza da própria mercadoria. Não se trata somente de a sua atenção ser absorvida pelo valor como grandeza. A razão disso é mais profunda. A forma-valor do produto de trabalho é a forma mais abstrata e mais geral do atual modo-de-produção, [burguês], que adquire, por isso mesmo, um caráter histórico, o caráter de um modo particular de produção social. Se se comete o erro de a tomar pela forma natural, eterna, de toda a produção em todas as sociedades, perde-se necessariamente de vista o lado especifico da forma-valor, logo, da forma mercadoria e, em maior grau, da forma-dinheiro, da forma-capital, etc. É isto que explica a razão por que se encontram em economistas, completamente de acordo entre si sobre a medição de grandeza do valor pela duração do trabalho, as ideias mais diversas e mais contraditórias sobre o dinheiro, ou seja, sobre a forma acabada do equivalente geral. Nota-se isto sobretudo quando se trata de questões como a dos bancos, por exemplo; é então um nunca mais acabar de definições do dinheiro e de lugares-comuns constantemente debitados a este propósito. [Por isso surgiu em sentido contrário um sistema mercantilista restaurado (Ganilh, etc.) que vê no valor apenas a forma social, ou melhor, apenas a sua aparência desprovida de substância.] Aproveito para chamar a atenção, uma vez por todas, que entendo por economia política clássica toda a economia que, a partir de Willlam Petty procura penetrar no conjunto real e intimo das relações de produção na sociedade burguesa, por oposição à economia vulgar, que se contenta com as aparências, rumina sem cessar, por necessidade própria e para vulgarização dos fenômenos mais notórios, os materiais já elaborados pelos seus predecessores, limitando-se a erigir pedantemente em sistema e a proclamar como verdades eternas as ilusões com que os burgueses gostam de povoar o seu mundo, para eles o melhor dos mundos possíveis. “

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