Em 1873, Marx escreve o posfácio da 2ª edição alemã do primeiro volume
de O Capital e faz uma avaliação de seus críticos.
“O senhor M. Block — Les théoriciens du
socialisme en Allemagne. Extrait du Journal des Economistes, juillet et août
1872 — descobre que o meu método é analítico e diz, entre outras coisas:
«Par cet ouvrage, M. Marx se classe parmi
les esprits analytiques les plus éminents.»(4*
Os autores de recensões
alemães, naturalmente, gritam que é sofística de Hegel. O Mensageiro da
Europa, de Petersburgo, num artigo que trata exclusivamente do método do Kapital
(número de Maio de 1872, pp. 427-436), acha o meu método de pesquisa
rigorosamente realista, mas o meu método de exposição infelizmente
germano-dialético. Diz ele:
«À primeira vista, a julgar pela forma
exterior da exposição, Marx é um grande filósofo idealista e, precisamente, no
sentido "alemão", isto é, o mau desta palavra. De fato, porém, ele é
infinitamente mais realista do que todos os seus antecessores em matéria de
crítica econômica... De maneira nenhuma se pode já considerá-lo um idealista.»
Não posso responder melhor ao
senhor autor do que através de alguns extratos da sua própria crítica, que,
além disso, poderão interessar a muitos dos meus leitores para quem o original
russo é inacessível.
Depois de uma citação do meu
prefácio a Kritik der Pol. Oek , Berlin, 1859, pp. IV-VII, onde debati a
base materialista do meu método, o autor prossegue:
«Para Marx só uma coisa é importante:
encontrar a lei dos fenômenos, de cuja investigação ele se ocupa. E, para ele,
é importante não uma lei que os rege enquanto eles têm uma certa forma e
enquanto se encontram na conexão que é observada num dado período de tempo.
Para ele, é ainda acima de tudo importante a lei da sua mutabilidade, do seu
desenvolvimento, isto é, da passagem de uma forma à outra, de uma ordem de
conexões à outra. Uma vez que descobriu esta lei, encara mais em pormenor as
consequências nas quais a lei se manifesta na vida social... De acordo com
isto, Marx preocupa-se com uma só coisa: demonstrar, através de uma
investigação científica precisa, a necessidade de determinadas ordens das
relações sociais e por constatar, tão irrepreensivelmente quanto possível, os
fatos que lhe servem de pontos de partida e de apoio. Para isso é perfeitamente
suficiente que ele, tendo demonstrado a necessidade da ordem atual, demonstre
também a necessidade de uma outra ordem, para a qual tem inevitavelmente de ser
feita uma passagem a partir da primeira, sendo totalmente indiferente que se
acredite ou não nisso, se esteja consciente ou não disso. Marx encara o
movimento social como um processo histórico-natural, dirigido por leis que não
só não se encontram dependentes da vontade, da consciência e da intenção do
homem, como determinam elas próprias a sua vontade, consciência e intenções...
Se o elemento consciente na história da cultura desempenha um papel tão
subordinado, é compreensível então que a crítica, cujo objeto é a própria
cultura, tanto menos possa ter por fundamento qualquer forma ou qualquer
resultado da consciência. Isto é, não é a ideia mas apenas o fenômeno exterior
que lhe pode servir de ponto de partida. A crítica limitar-se-á à comparação e
confronto de um fato, não com a ideia mas com outro fato. Para ela apenas é
importante que ambos os fatos sejam estudados o mais precisamente possível e
realmente constituam diferentes graus de desenvolvimento; mas acima de tudo é
importante que não menos precisamente seja estudada a ordem, a sequência e
ligação em que se manifestam estes graus de desenvolvimento [...] A outro
leitor pode aqui ocorrer a seguinte questão [...] as leis gerais da vida econômica
não são as mesmas, sendo indiferente que se apliquem à vida presente ou à
passada? Mas precisamente isto Marx não o admite. Para ele tais leis gerais não
existem... Em sua opinião, pelo contrário, cada grande período histórico possui
as suas próprias leis... Mas assim que a vida ultrapassou um dado período de
desenvolvimento, saiu de um dado estádio e entrou noutro, começa também a ser
guiada por outras leis. Numa palavra, a vida econômica oferece-nos neste caso
um fenômeno perfeitamente análogo àquilo que observamos noutras classes dos
fenômenos biológicos... Os velhos economistas não compreendiam a natureza das
leis econômicas, ao considerá-las do mesmo tipo das leis da física e química...
Uma análise mais profunda dos fenômenos mostrou que os organismos sociais
diferem uns dos outros não menos profundamente do que os organismos botânicos e
zoológicos... Um mesmo fenômeno, em consequência da diferença de estrutura
destes organismos, da diversidade dos seus órgãos, das diferenças de condições
em que os órgãos têm de funcionar, etc, está subordinado a leis perfeitamente
diferentes. Marx nega-se, por exemplo a admitir que a lei do aumento da
população seja a mesma sempre e em toda a parte, para todos os tempos e para
todos os lugares. Afirma, pelo contrário, que cada grau de desenvolvimento tem
a sua própria lei da reprodução... Dependendo das diferenças do nível de
desenvolvimento das forças produtivas, alteram-se as relações e as leis que as
regulam. Ao colocar-se, assim, a si próprio o objetivo de investigar e explicar
a ordem capitalista da economia, Marx apenas formulou de um modo rigorosamente
científico o objetivo que toda a investigação precisa da vida econômica tem de
ter... O seu valor científico reside no esclarecimento das leis particulares a
que estão submetidos o surgimento, existência, desenvolvimento e morte de um
dado organismo social e a sua substituição por um outro, superior. E o livro de
Marx tem de fato este valor.»
O senhor autor, ao descrever
tão acertadamente aquilo a que chama o meu método real e tão benevolentemente o
que à minha aplicação pessoal dele concerne, que outra coisa descreveu ele
senão o método dialético?”
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