sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O Fetichismo da Mercadoria e o seu Segredo.Parte 3


Esta 3ª parte abre com a afirmativa da postagem anterior: :Para encontrar algo de análogo a este fenômeno, é necessário procurá-lo na região nebulosa do mundo religioso”. E se encerra com a afirmativa de que o valor não traz escrito na testa o que ele realmente é “Longe disso, ele transforma cada produto do trabalho num hieróglifo [social]. Somente com o tempo o homem procurará decifrar o sentido do hieróglifo, penetrar nos segredos da obra social para a qual contribui, pois a transformação dos objetos úteis em valores é um produto da sociedade, tal como o é a linguagem”.
 “Para encontrar algo de análogo a este fenômeno, é necessário procurá-lo na região nebulosa do mundo religioso. Aí os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, entidades autônomas que mantêm relações entre si e com os homens. O mesmo se passa no mundo mercantil com os produtos da mão do homem. É o que se pode chamar o fetichismo que se aferra aos produtos do trabalho logo que se apresentam como mercadorias, sendo, portanto, inseparável deste modo-de-produção.
[Este caráter fetiche do mundo das mercadorias decorre, como mostrou a análise precedente, do caráter social próprio do trabalho que produz mercadorias.]
Os objetos úteis só se tornam em geral mercadorias porque são produtos de trabalhos privados, executados independentemente uns dos outros. O conjunto destes trabalhos privados constitui o trabalho social [global]. Dado que os produtores só entram em contacto social pela troca dos seus produtos, é só no quadro desta troca que se afirma também o caráter [especificamente] social dos seus trabalhos privados. Ou melhor, os trabalhos privados manifestam-se na realidade como frações do trabalho social global apenas através das relações que a troca estabelece entre os produtos do trabalho e, por intermédio destes, entre os produtores. Daí resulta que para estes últimos, as relações [sociais] dos seus trabalhos privados aparecem tal como são, ou seja, não como relações imediatamente sociais entre pessoas nos seus próprios trabalhos, mas antes como [relações materiais entre pessoas e] relações sociais entre coisas.
Somente pela troca é que os produtos do trabalho adquirem, como valores, uma existência social idêntica e uniforme, distinta da sua existência material e multiforme como objetos úteis. Esta cisão do produto do trabalho, em objeto útil e objeto de valor, só teve lugar na prática a partir do momento em que a troca adquiriu extensão e importância bastantes para que passassem a ser produzidos objetos úteis em vista da troca, de modo que o caráter de valor destes objetos é já tomado em consideração na sua própria produção.
A partir desse momento, os trabalhos privados dos produtores adquirem, de fato, um duplo caráter social. Por um lado, como trabalhos úteis [determinados], devem satisfazer uma determinada necessidade social, afirmando-se portanto como partes integrantes do trabalho global, isto é, do sistema de divisão social do trabalho que se forma espontaneamente; por outro lado, só satisfazem as diversas necessidades dos próprios produtores, na medida em que cada espécie de trabalho privado útil é permutável - isto é, é equivalente a - qualquer outra espécie de trabalho privado útil. A igualdade de trabalhos que diferem toto coelo uns dos outros só pode consistir numa abstração da sua desigualdade real, na redução ao seu caráter comum de dispêndio de força humana, de trabalho humano abstrato, e é somente a troca que opera esta redução, pondo em presença uns dos outros, num pé de igualdade, os produtos dos mais diversos trabalhos.
O duplo caráter social dos trabalhos privados apenas se reflete no cérebro dos produtores sob as formas em que se manifestam no tráfico concreto, na troca dos produtos; [o caráter socialmente útil dos seus trabalhos privados, no fato de o produto do trabalho ter de ser útil, e útil aos outros; e o caráter social de igualdade dos diferentes trabalhos" no caráter comum de valor desses objetos materialmente diferentes os produtos do trabalho.]
Quando os produtores relacionam os produtos do seu trabalho a título de valores, não é que eles vejam neles um simples invólucro sob o qual se esconde um trabalho humano idêntico; pelo contrário, ao considerarem iguais na troca os seus diversos produtos, pressupõem com isso que os seus diferentes trabalhos são iguais. Eles fazem-no sem o saber. Portanto, o valor não tem, escrito na fronte, o que ele é. Longe disso, ele transforma cada produto do trabalho num hieróglifo [social]. Somente com o tempo o homem procurará decifrar o sentido do hieróglifo, penetrar nos segredos da obra social para a qual contribui, pois a transformação dos objetos úteis em valores é um produto da sociedade, tal como o é a linguagem.

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